Reduzir poluição é chave para controlar crise hídrica e socioambiental

Autor: Evandro Tosin – Assistente de Comunicação Acadêmica

O Brasil tem 12% das reservas de água doce do mundo e 53% dos recursos hídricos da América do Sul, de acordo com dados do MapBiomas, uma iniciativa do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima (SEEG/OC) e elaborado por ONGs, universidades e empresas de tecnologia.

Mesmo assim, entre os meses de agosto de 2020 e setembro de 2021, o Brasil viveu a sua maior crise hídrica em 91 anos. Em contraste com a abundância de reservas hídricas, o racionamento de abastecimento de água em grandes centros urbanos, passou a fazer parte do cotidiano da população. Nos últimos 30 anos, o país perdeu 15,7% da sua superfície de água, ou seja, o Brasil teve uma redução de 3,1 milhões de hectares dessa reserva, o equivalente a um nordeste e meio, segundo relatório da MapBiomas.

E uma crise hídrica vai muito além da escassez de água, afinal, a poluição também é um problema, como explica a doutoranda em Engenharia de Recursos Hídricos e Ambiental pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) Bárbara Alves de Lima: “Implica em você ter menos áreas de abastecimento pra captação. A gente hoje tem poucos mananciais de abastecimento e se a gente polui esses mananciais, a concessionária tem que ir cada vez mais longe para fazer a captação de água em condições. Pra ela, é muito caro tratar um rio que não tem oxigênio”.

No seu mestrado, realizado no Programa de Ciência e Tecnologia Ambiental pela Universidade Tecnológica do Paraná (UTFPR), Barbara estudou justamente os efeitos da ação humana para a condição de acesso à água, com a dissertação intitulada “Estudo da poluição hídrica do complexo estuarino de Paranaguá-PR, causado pela presença de HPAS, N-Alcanos e contaminantes emergentes”.

“Além do próprio despejo que a gente faz nos rios, existe a questão do desmatamento de matas ciliares e do aterramento de nascentes. Os desbarrancamentos são a natureza tentando se equilibrar, porque o ser humano foi lá e invadiu uma área que não era para ser invadida. A mata ciliar é para a manutenção do solo daquela região, aquelas árvores e vegetação seguram o solo. Quando a gente tira, faz com que esse solo perca a capacidade de assentamento. Então, em algum momento vai desbarrancar. Se você tem assoreamento de rio, ele não vai mais conseguir drenar naquela área, mas vai encher, transbordar e ter alagamento”, explica a pesquisadora.

A docente dos cursos de pós-graduação da área de Meio Ambiente da Uninter Márcia Cristiane Kravetz Andrade também é pesquisadora da temática. Em 2020, concluiu o Mestrado em Ciência e Tecnologia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) com a dissertação intitulada como “Avaliação de contaminantes no Rio Iguaçu: variação da concentração de cafeína, HSFs e do IGCH”. Além de gestora ambiental, Marcia atualmente é Doutoranda no Programa de Pós-graduação em Sustentabilidade Ambiental Urbana pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).

Ela alerta para a responsabilidade coletiva com relação à temática. “A crise hídrica é de responsabilidade de todos, pois todos, como a sociedade civil, o poder público e o privado, fazem parte do meio ambiente, estamos interligados. Claro que existem os fenômenos naturais como precipitação, as mudanças climáticas, a escassez e diversos outros fatores, mas precisamos ter a sensibilização de contribuir com a preservação e a conservação dos nossos recursos naturais”, aponta Marcia.

Atitudes cotidianas conscientes fazem parte das ações necessárias em defesa dos recursos hídricos. “Não poluir faz parte desse montante, independente de questões políticas, econômicas e sociais. Começa na separação correta dos resíduos, no consumo consciente da água, no controle da energia elétrica gasta na residência. Se cada um fizer a sua parte, no final o resultado será positivo”, conclui.

Contaminantes emergentes

Existem diversos tipos de poluentes e contaminantes dentro dos recursos hídricos. Dentre eles, um tipo tem despertado a atenção de pesquisadores e cientistas, os chamados contaminantes emergentes. “São elementos que estão em nosso cotidiano e são elementos bem comuns”, explica Bárbara. Exemplos desse tipo de poluente são os parabenos utilizados em xampus, o bactericida triclosan utilizado em sabonetes, hormônios como progesterona, estrona ou estenilestadiol que são utilizados em anticoncepcionais, além dos fármacos de modo geral.

De acordo com a pesquisadora, esses compostos são considerados emergentes porque não estão em programas de monitoramento ou legislação. Com poucos estudos a respeito do tema, eles são compostos químicos encontrados em diversas matrizes ambientais: água, solo, ar, animais, vegetação, etc.

Outro exemplo é a cafeína, substância encontrada em café, refrigerante, chá, chocolate, além de suplementos alimentares. Devido ao seu uso e descarte contínuo, a substância acende o alerta já que pode causar efeitos em alguns animais, como a agitação. Segundo pesquisa de Alinne Mizukawa, do monitoramento realizado pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB), as estações de tratamento de esgotos só realizam a remoção parcial da cafeína e de outras substâncias emergentes. Sem o tratamento, esses compostos acabam chegando a rios e lagos.

A realidade brasileira em serviços de água e esgoto

O Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), vinculado à Secretaria Nacional de Saneamento do Ministério do Desenvolvimento Regional (SNS/MDR), realiza levantamento de dados e informações para mensurar a evolução dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Brasil (desde 1995), de manejo de resíduos sólidos urbanos (desde 2002) e drenagem e manejo das águas pluviais urbanas (desde 2015).

O último diagnóstico de Serviços de Água e Esgoto no país, com dados de 2020, indica que houve a coleta de 6 bilhões de m³/ano de esgoto em 2020 e 4,8 bilhões de m³/ano de esgoto tratado nos 4.744 municípios brasileiros abrangidos pelo levantamento.

“Entretanto, quando vamos falar de atendimento de rede pública de esgoto, notamos uma disparidade entre as regiões Norte (13,1% de atendimento, equivalente a 2,3 milhões de pessoas), Nordeste (30,3% (16,9 milhões de pessoas), Centro-oeste (59,5%, ou 9,7 milhões de pessoas), Sudeste (80,5%, 71,4 milhões de pessoas) e Sul (47,7%, ou 14,3 milhões de pessoas atendidas)”, explica Márcia.

Ainda de acordo com a docente da Uninter, quando olhamos para este cenário sob a ótica urbana individual dos estados temos São Paulo (atende 93,5%), Paraná (84,5%), Minas Gerais (83%) e Roraima (80,7%), com os melhores índices de atendimento percentual urbano de rede coletora de esgoto, enquanto Mato Grosso do Sul (64,8%), Goiás (64,3%) e Bahia (55%) ficam com valores intermediários. Tem-se os estados com menores índices, como é o caso do Maranhão (19,1%), Pará (10,7%), Rondônia (7,8%) e o menor índice no Amapá (7,7%).

“Cabe lembrar, entretanto, que esta é a realidade da rede coletora, apenas. Quando se fala de eficiência de tratamento, este cenário muda e estados como o Paraná (74%), Roraima (70,4%) e São Paulo (69,6%) passam a apresentar percentuais maiores em relação a outros estados, enquanto estados como Piauí (15,9%, Pará (10%) e Rondônia (8,5%) apresentam índices muito baixos”, recorda Márcia.

O assunto “Crise hídrica e socioambiental, o que implica na qualidade da água” foi debatido na Supermaratona Uninter Terra – Planeta Água, realizada nos dias 18 e 19 de março. A palestra contou com a participação da coordenadora de cursos de pós-graduação na área de Meio Ambiente da Uninter, Sandra Lopes, da docente Márcia Kravetz e da convidada Bárbara Alves de Lima. Para assistir ao conteúdo completo, acesse aqui.

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Autor: Evandro Tosin – Assistente de Comunicação Acadêmica
Edição: Larissa Drabeski


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