O normal da maternidade

Autor: Fernanda Letícia de Souza*

A menina é criada dentro de um universo que a prepara desde muito cedo para aceitar e desejar a maternidade. As brincadeiras com loucinhas e bonecas despertam o instinto do cuidar. Todos acham “normal e fofo” quando a menina coloca uma almofada por baixo da camiseta, fingindo uma gestação.

E em meio a este normal, a menina se torna mulher. Inicia um relacionamento e logo faz planos de casar-se e, é claro, ter filhos. Afinal, nada mais confortável do que viver dentro do padrão em uma sociedade guiada por modelos ideais.

As tentativas para engravidar começam, mas a gravidez não chega. A ansiedade aumenta e a pressão se torna quase insuportável. A cada visita da sogra, a cada roda de conversa com amigos, a fatídica pergunta aparece: quando chega o bebezinho?

Entre calendários de fertilidade e testes negativos, vem a notícia bombástica da incapacidade de gerar um bebê. A realidade dura bate na porta e lhe diz que não é normal. Afinal, o ciclo da vida não consiste em crescer, casar e gerar filhos para dar continuidade à sua linhagem?

Uma luz parece surgir no fim do túnel. Caros processos de fertilização in vitro e inseminação artificial. Clínicas luxuosas prometendo o tão sonhado bebê a preços exorbitantes. Ela se questiona. Por que está sendo punida deste jeito? Por que não é merecedora da maternidade?

E então o mundo da adoção surge em sua vida. Ela começa a fazer cursos, conhece pessoas fantásticas que a ensinam a cada dia a força do amor. Ela entende que ser mãe não é sinônimo de gerar. E que, nem sempre, quem gera se torna mãe.

A sensação de anormalidade ainda lhe acompanha por algum tempo. Muitos preconceitos precisam ser quebrados e muitos tabus precisam ser derrubados. Muitas pessoas não estão preparadas para entender que o amor é construído no dia a dia, e não basta uma barriga para que o vínculo aconteça.

A gestação na adoção tem suas particularidades. Não há enjoos, e sim papéis e atestados a serem entregues na vara da infância. Não há livros dizendo que seu bebê está do tamanho de uma ervilha, mas há cursos e leituras que ensinam a enfrentar os desafios e a lidar com as dificuldades que podem surgir. A espera, na maioria das vezes, dura muito mais que 9 meses e é dura e angustiante. Em vez de uma barriga crescendo, você tem um coração se tornando gigante.

O telefone toca! É a sua “bolsa estourando”. Do outro lado da linha, uma assistente social lhe diz que seu filho chegou! E deste dia em diante, ao ver o sorriso tímido e o corpinho curvado de medo e expectativa, ela vive todos os dias a certeza de que em momento algum foi punida com a infertilidade.

Esta mulher foi escolhida para viver a experiência mais incrível que a vida poderia lhe proporcionar.

É quando se entende que não há normal ou anormal no ato de maternar. Que uma criança somente se torna seu filho quando você a adota com todo o seu coração, independentemente de ela ter vindo de sua barriga ou de outra. E que é o amor que transforma simples estranhos em uma família de verdade.

* Fernanda Letícia de Souza é especialista em Fisiologia do Exercício e Prescrição do Exercício Físico, professora dos cursos de bacharelado e licenciatura em Educação Física da Uninter e mãe por adoção da Isabela e do Eduardo.

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Autor: Fernanda Letícia de Souza*
Créditos do Fotógrafo: Pixabay


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