O Brasil, a logística e os “voos de galinha”

Autor: Roberto Pansonato*

É bem interessante como algumas profissões e segmentos ocupacionais são lembrados em função de datas comemorativas ou de intervenções externas que podem atuar sobre o sistema. Por exemplo, lembramos muito dos professores por ocasião da comemoração do seu dia, que aqui no Brasil ocorre em 15 de outubro.

Nos dias de hoje, por exemplo, em função dos reflexos da pandemia da Covid-19 a que todos nós estamos submetidos, a profissão do médico e dos demais profissionais ligados à área da saúde vem à tona, ressaltando a sua enorme importância dentro da sociedade como um todo. Hoje, os médicos e as pessoas vinculadas à área de saúde, estão fazendo um trabalho extraordinário. Mas, se há algo que também tem ajudado as pessoas nesse momento difícil, é a logística.

Como fazer para que respiradores adquiridos em países como a China cheguem ao nosso país e sejam direcionados aos hospitais sem a intervenção da logística? Para aqueles que têm o privilégio de trabalhar em home-office e comprar comida por meio da internet, por exemplo, isso só é possível por meio de uma grande movimentação de toda a cadeia de suprimentos. Portanto, mais do que uma necessidade econômica – que já justificaria a importância dos processos logísticos – trata-se também da necessidade de sobrevivência.

Muitos defendem que a humanidade passa, de tempos em tempos, por importantes provações para que, da extrema necessidade se obtenham soluções e melhorias na vida das pessoas. Bom, na minha despretensiosa opinião, não acredito que o ser humano deva obrigatoriamente passar por tantos sofrimentos para obter ganhos evolutivos. Será que só funcionamos por meio do “no pain, no gain” (sem dor, sem ganho)?

No entanto, para os processos logísticos, que é o foco desse texto, isso realmente ocorre. Atualmente, com as medidas de restrições impostas pela quarentena, os processos logísticos estão sendo colocados à prova, especialmente se considerarmos as importações de produtos com entrega em tempo recorde ou mesmo as entregas para atender ao e-commerce, maneira pela qual os consumidores brasileiros passaram a adquirir produtos e têm, assim, movimentado a economia.

Já se tem observado, de uma forma geral – alguma restrição ou gargalo – nas entregas conhecidas como “last mile” (última milha), nas quais a mercadoria sai de um armazém ou centro de distribuição para o destino final, podendo ser um B2B ou um B2C. Acredito ser um momento importante para se definir regularizações, meios alternativos para transportes e armazenagem e outras melhorias e inovações para o setor.

Por que não utilizar os drones em determinadas entregas? Com relação às entregas, muitas delas não são finalizadas devido à ausência do morador no momento da entrega. Talvez seja uma oportunidade para massificar as caixas de correios inteligentes (os chamados “lockers”). É evidente que não é nesse texto que vamos discutir soluções para questões complexas conforme as apresentadas, mas é necessário fazer evoluir ideias desse tipo para futura aplicação.

Voltando ao pensamento de que algumas ações apenas ocorrem quando se defrontam com algum problema mais grave, ou seja, sempre na correção, quando muitas vezes poderia ser na prevenção, vamos analisar a greve dos caminhoneiros que aconteceu no ano de 2018. Por mais justa que ela tenha sido, essa mobilização causou graves problemas de abastecimento em todas as regiões do país e disparou um alarme com relação à multimodalidade no Brasil.

Dados da CNT (Confederação Nacional do Transporte), mostram que o segmento de cabotagem – transporte realizado na costa marítima entre portos de um mesmo país – registrou crescimento de 38,2% no segundo semestre de 2018, logo após a greve. E continua crescendo, mesmo com todas as dificuldades. Com uma extensa costa marítima e com boa parte da população brasileira vivendo próxima a essa costa, é estranho pensar em como a cabotagem, só depois de 2018, começou a apresentar crescimentos expressivos.

Poderíamos ficar por horas apontando as oportunidades de negócios e melhorias de processos logísticos que podem impactar positivamente na vida de todos nós. Parcerias público-privadas, com base no tripé da sustentabilidade (desenvolvimento econômico, social e ambiental) podem proporcionar excelentes projetos para a logística no Brasil. Ressalto aqui, que essas parecerias devem ser transparentes, para que não haja a promiscuidade nos negócios que, infelizmente, ainda acontece em nosso país.

Você pode estar se perguntando: será que fazemos tudo errado? Obviamente que não, somos um país de grande potencial (o agronegócio é um ótimo exemplo), mas que precisa dar sustentabilidade aos seus projetos de futuro.

Por algum motivo, nós ainda estamos na condição de melhorias inconsistentes, ou seja, são os famosos “voos de galinha”. Quem sabe não seja esse o momento de nos reinventarmos em termos de nação que almeje um futuro melhor para sua população? E, com certeza, nesse caminho a logística tem uma participação mais que especial.

* Roberto Pansonato é professor tutor do curso superior de Tecnologia em Logística da Uninter.

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Autor: Roberto Pansonato*
Créditos do Fotógrafo: Pixabay


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