Uma outra versão da nossa história: a relação do Brasil com a cachaça

Autor: Natália Schultz Jucoski - estagiária de jornalismo

Você sabia que a cachaça nasceu junto com o Brasil? A origem da bebida conta com um envolvimento do povo brasileiro, africano e europeu que muita gente não sabe.

O início desta história se dá pela valorização da cana-de-açúcar vinda do sudoeste asiático e explorada pelos colonizadores da Europa. Os países europeus não possuem um clima propício para o cultivo, sendo assim os portugueses começaram a plantação em outros locais, como o Brasil. O ciclo da cana teve início em de 1532 e permaneceu como prioridade no nosso país durante quase dois séculos, com as capitanias hereditárias. É nessa produção de açúcar que acontece o nascimento da cachaça.

A bebida tão popular foi tema do primeiro programa Fala, prof! do ano. O geógrafo e guia turístico Rafael Leporage Freitas conversou com a professora Relly Amaral sobre a origem da cachaça e sua relação com a escravidão no país.

Rafael é carioca, mora em Paraty há cinco anos e lá comanda a Cachaça Tour, um passeio turístico focado na história da cidade e da bebida. O guia possui parceria com cinco cachaçarias e, conforme o grupo vai passeando pelo centro histórico, há paradas para degustação. Ele diz que ninguém termina seu tour bêbado, uma vez que o objetivo é levar aprendizado. “É um tour muito histórico. A gente começa abordando o ciclo da cana-de-açúcar, o nascimento da cachaça, meio de produção, o envelhecimento, a ida da cachaça para Minas Gerais, algumas curiosidades desses pontos históricos e a cachaça atualmente”, relata o geógrafo, que contou a história da transformação da cana-de-açúcar em cachaça.

Durante o ciclo da cana, os escravos eram os responsáveis por toda a produção nos engenhos. Em uma das fases do processo, a cana era colocada em uma temperatura muito alta e uma das consequências era a formação de uma espuma que não tinha utilidade. Esse resíduo era descartado no comedouro dos animais e ali fermentava naturalmente, transformando-se em um caldo que, por estar junto com o resto da comida, os animais o bebiam.

Então, os escravos começaram a notar a diferença de comportamento dos bichos que estavam mais alegres e dispostos, então decidiram tomar o caldo também. Tanto os indígenas quanto os africanos já tinham o conhecimento de algo que causava um efeito parecido, o fermentado de mandioca (cauim) e o fermentado a base de palmeira (malafo), respectivamente.

Mais uma vez a diferença de comportamento foi notada, desta vez pelos senhores de engenho, que também tinham o conhecimento sobre fermentação, da uva que se tornava o vinho. A partir disso, fizeram o mesmo processo com a cana-de-açúcar e assim nasceu a cachaça, que ficou popularmente conhecida só no século 18, quando foi para Minas Gerais.

O século 19 foi o período mais intenso da cachaça, mas em 1888 com a abolição da escravatura, vários lugares do país, inclusive Paraty, perderam bastante produção, pois eram muito dependentes da mão de obra escravizada, começando assim a quebrar o ciclo escravocrata.

Todo esse passeio pela história do Brasil através das ruas de Paraty tem como um dos objetivos trazer o reconhecimento da bebida como algo intrínseco à cultura brasileira. “Até uma parte do meu trabalho com o cachaça tour é desmistificar um pouco essa questão do cachaceiro, da cachaça de primeira e segunda. Botar a cachaça no patamar que ela merece. É um dos objetivos do meu trabalho. E pelo o que eu vejo por rodas de conversa e tal, cada vez mais ela tá ganhando o status que ela merece”, explica Rafael.

A história de como foi o nascimento dessa bebida, que é tipicamente brasileira, vai além da pura curiosidade. Serve como reflexão sobre a necessidade de uma longa reparação histórica, já que toda a mão-de-obra era escravizada. É um passado que deve ser revisitado constantemente, pois, infelizmente, muitas coisas tipicamentes brasileiras nasceram a partir do sofrimento de populações escravizadas.

O programa na íntegra pode ser conferido clicando neste link.

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Autor: Natália Schultz Jucoski - estagiária de jornalismo
Edição: Larissa Drabeski
Créditos do Fotógrafo: Pixabay e reprodução do Youtube


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