O impacto do avanço tecnológico nas desigualdades sociais

Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo

A fome e o desenvolvimento sustentável, assim como o avanço tecnológico, estão diretamente ligados à questão das desigualdades sociais. Neste momento de pandemia, principalmente, é possível notar mais claramente a discrepância das realidades no contexto da educação, por exemplo. As aulas, intermediadas pela internet, excluem aqueles que não possuem acesso e ditam os níveis de aprendizagem dos estudantes.

“Pensar na desigualdade é fundamental para começarmos a entender por onde passa todo esse processo de reflexão sobre essa questão da fome no Brasil e no mundo, justamente em um momento como esse. Parece que isso [a pandemia] trouxe à tona algumas coisas que nós não estávamos acostumados a ver a olho nu cotidianamente”, afirma Silmara Aibes, professora de Sociologia da Tecpuc.

Devido à importância tão urgente de se discutir sobre o assunto, a relação entre economia e desigualdades sociais se tornou tema da aula magna da Área de Exatas da Escola Superior de Educação (ESE) da Uninter, com transmissão ao vivo pela página do Facebook e pelo Youtube.

“Economia é um dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), que foram adotados em 2015 a partir de uma reunião de chefes de Estado e de governo na sede da Organização das Nações Unidas (ONU) em Nova York. Foi uma decisão histórica dos países membros da ONU para unir forças em prol de uma agenda mundial de desenvolvimento sustentável, que deve ser cumprida até o ano de 2030”, explica o professor Paulo Martinelli, coordenador da Área de Exatas da ESE.

Silmara trouxe para o debate o termo da ecobiologia interior, que seria o equilíbrio e a relação holística entre o indivíduo, a natureza e a relação com o transcendente, ou seja, o ser humano conectado com as relações sociais de forma igual. Segundo a profissional, a crise alimentar passa pelo “desequilíbrio que há dentro da nossa sociedade entre as pessoas, a relação com o entorno”.

O filósofo alemão Hans Jonas, embora falecido no ano de 1993, tem ganhado destaque pela atualidade de suas ideias, que abordam a relação do ser humano com a natureza e as tecnologias, além de refletir no que tudo isso implica. Jonas fala sobre a evolução do homo sapiens para o homo faber, a partir da Revolução Industrial no século 18. O impacto da relação do homem com a tecnologia, que passa a produzir, criar e transformar, mas que também é questionada por ele.

“A tecnologia não é simplesmente uma benção, mas também pode ser uma maldição. A tecnologia tem um caráter ambivalente, como qualquer ferramenta. Ela pode ser usada para construir ou para destruir. Nós não podemos negar a nossa responsabilidade diante desse saber”, enfatiza André Barreto, professor de Filosofia da Tecpuc.

Ainda que não fosse tecnofóbico, contra o progresso e a tecnologia, Hans Jonas também planta uma ideia de suspeita sobre todo esse progresso e como a tecnologia é utilizada diante da polarização de ideologias que surgem da Revolução Industrial, dividindo as políticas entre direita e esquerda. Isto porque os dois lados se apoiam no avanço sem se preocupar com os perigos que ele também é capaz de causar.

“O quanto o progresso está nos custando? Talvez ele não custe muito para quem está estudando ali na PUC, que fica em um bairro bom de Curitiba (PR), mas do lado nós temos justamente uma comunidade carente. Esse progresso é para quem? Até onde está chegando o progresso?”, reflete Barreto.

Silmara diz que quando se fala de fome, além da desigualdade social, se fala de renda per capita, de moradia, do ser social que também é cultural. Ela cita uma normalização da pobreza e da violência, dando o exemplo de crianças em situação de rua dormindo nas calçadas do centro de Curitiba, uma das cidades mais frias do país.

“As pessoas começam a se acostumar com a situação, passam ao lado, pulam por cima e de repente toda essa população vai se tornando invisível. Você fingir ou você não conseguir mais ver uma criança que está descalça, desagasalhada, dormindo nas calçadas de uma cidade tão fria, isso é normalizar a violência”, explica. Ela completa dizendo que “nós estamos vivendo um curto período de tempo, durante a pandemia, de alta vulnerabilidade social em todos os níveis”.

A conscientização da população sobre o poder que têm sobre a política e quem governa é um ponto fundamental. No Brasil há um notável desinteresse por parte das pessoas, é algo que ainda necessita trabalho, incentivo e compreensão de sua devida importância. A questão é que mesmo aqueles que desenvolvem interesse e intenção de participação mais ativa encontram obstáculos neste caminho.

“As cartas estão na mesa, a gente que não pega. A nossa participação é vetada por manobras que são feitas justamente para impedir a nossa participação, a começar pelo horário que os políticos se reúnem para votar as leis”, pontua Barreto.

Segundo o professor, a fome como uma questão moral é uma novidade, pois só começamos a refletir e questionar valores de cuidado com o próximo a partir do século 18, com a queda de sistemas políticos. Surge uma mudança de mentalidade utilizando a razão, modificando os padrões de orientação da sociedade como um todo, criando uma revolução econômica, social, política, religiosa, fazendo com que os valores anteriores fossem perdendo o sentido.

Hoje é possível notar uma preocupação mais latente também em relação à sustentabilidade e ao consumo consciente, já que quando se fala em reciclagem, por exemplo, as pessoas mais pobres e que vivem à margem dessa realidade, catando os materiais, é que são lembradas. Mas é preciso observar o comportamento daqueles que mais consomem e de que maneira isso pode impactar toda a questão da sustentabilidade, como isso atinge os menos afortunados, refletindo na sua qualidade de vida. Para isto existem pequenas ações com projetos, dentro e fora das escolas, que envolvem a conscientização.

“Eu vejo que isso está muito relacionado do ponto de vista da parte do comportamento humano como uma questão da prática. Eu acho que quando a gente é forçado a fazer, a gente acaba aprendendo muito mais. A pandemia é uma coisa que está trazendo isso para as pessoas. As pessoas estão sendo obrigadas a viver com menos. A gente tem que aprender a ser mais seletivo, a escolher bem o que nós estamos colocando dentro de casa e colocando evidentemente a partir disso fora de casa”, afirma Barreto.

Para Silmara, uma via de melhorar a questão da fome e do desenvolvimento sustentável no Brasil seriam as escolas públicas integrais, já que a educação é uma das chaves muito importantes para solucionar toda essa problemática.

“Nós, professores e professoras, temos um papel gigantesco nesse contexto que nós estamos conversando. O papel não só de informar, mas de ensinar o aluno a pensar, ensinar a ter essa consciência crítica, a construir esse pensamento. Para isso tem que ter muita determinação e para isso tem que ter objetivos claros”, finaliza Silmara.

Os professores foram os convidados do primeiro dia de debate da aula magna da Área de Exatas da ESE da Uninter, intitulada Produção e distribuição de alimentos. O bate-papo foi intermediado pelos professores Élcio Miguel Prus, Paulo Brito e Douglas Luiz e ainda contou com um segundo bloco para sanar as dúvidas das pessoas que acompanhavam ao vivo e interagiam via chat.

Incorporar HTML não disponível.
Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Nilson Nery/Wikimedia Commons e reprodução


1 thought on “O impacto do avanço tecnológico nas desigualdades sociais

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *