Ernst Haeckel, o biólogo e naturalista que ajudou a entender a evolução humana

Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo

O alemão Ernst Haeckel (1834-1919) foi biólogo, naturalista, filósofo, médico e professor. Uma atividade também exercida, mas menos conhecida, é a de artista. O pesquisador recebeu influências de grandes nomes, como Darwin e Humboldt, que desenvolveram literaturas de viagem, com a descrição de espécies e nativos de diferentes regiões. Assim como Schleiden, que trabalhava mais com descrições botânicas.

Mas qual é a importância de conhecer a história e o legado deixado por pesquisadores como Haeckel? De acordo com a professora Renata Garbossa, coordenadora da área de Geociências da Escola Superior de Educação (ESE) da Uninter, “isso é importante, uma vez que a gente está vivendo um momento em que percebe a relevância da ciência para novas descobertas, buscando soluções para que a gente possa avançar enquanto sociedade, não só brasileira, mas mundial”.

Da botânica para a medicina e da medicina para a zoologia

A professora mestre Laís Grossel, doutoranda em Zoologia na Universidade de São Paulo (USP), conta que desde muito jovem Haeckel tinha uma inclinação para a botânica, mas, por não ser considerada uma profissão “promissora”, em 1852 ele seguiu o incentivo do pai e começou a estudar medicina na Universidade de Wüzburg, Alemanha.

Mesmo sem interesse pelas disciplinas e sem se ver como profissional da área, o corpo docente da instituição, especialmente os professores Virchow e Kölliker, foram responsáveis pela permanência do estudante. Isso porque ele teve a oportunidade de realizar algumas atividades de iniciação científica. Durante a graduação, também conheceu o professor Johannes Müller, “um zoólogo muito proeminente da época”, diz Laís.

Tudo mudou durante um período de verão em que Haeckel convidou um amigo para uma viagem a Helgoland, que fazia parte de um arquipélago alemão. A intenção era coletar algas para estudar a anatomia delas, assim unia o estudo da medicina voltado para os organismos vegetais, grupos de interesse dele até aquele momento.

Algumas semanas depois, o professor Müller apareceu na mesma região com o filho e os convidou para ajudar em algumas coletas de equinodermos (estrelas do mar, ouriços). “Foi aí que a ‘chavinha’ virou no Haeckel e ele acabou se encantando pela zoologia, especialmente pela zoologia de invertebrados marinhos”, explica a professora. Para o trabalho de conclusão de curso, Haeckel realizou um estudo de histologia sobre astacus astacus, um organismo que não era humano, “espécie de lagostim”. E assim, em 1858, consegue o título de médico.

Início do trabalho com ciências biológicas e principais obras

Em 1859, Haeckel decide pesquisar os radiolários e parte para o Sul da Itália com o intuito de coletar materiais para os primeiros estudos, concluído apenas em 1862. “Foi um trabalho tão bem feito, minucioso, com descrição de novas espécies, de estrutura, da microestrutura desses organismos, que dois anos depois ele recebeu como se fosse uma medalha de honra ao mérito, a medalha Cothenius. O trabalho dele foi, inclusive, lido por Darwin, que achou fantástico o que ele tinha escrito”, salienta Laís. Além disso, a pesquisa rendeu um cargo e professor temporário na Universidade de Jena, que depois se tornou permanente.

Com o estudo concluído, Haeckel pôde se debruçar sobre “A origem das espécies”, obra de Charles Darwin, publicada em 1859 e traduzida para a língua alemã por Heinrich George Bronn. Em 2008, Richards, biógrafo do pesquisador, cita que “daquele útero fértil ele emergiu recém-nascido para a teoria de Darwin e o zelo de sua convicção nunca esfriou nos últimos dias”. Laís afirma que “Hackel leu, compreendeu e passou a vislumbrar toda a natureza, todos os organismos sob a luz da evidência”.

Quando se fala em evolução do desenvolvimento humano, automaticamente se pensa em Darwin, mas a professora lembra que Haeckel publicou o livro História da criação em 1968, dois anos antes da obra A descendência do homem, do naturalista inglês, que defendia as mesmas ideias.

“No ‘A descendência do homem’, Darwin tentou traçar a descendência dos humanos a partir de um ancestral semelhante ao macaco, enquanto Haeckel, dois anos antes, tenta reconstruir e visualizar os caminhos exatos da evolução do homem. Então, ele é muito mais específico nos seus propósitos. E um dos pontos mais legais, que eu considero, é que o Haeckel hipotetizou que, em tempos passados, várias espécies de hominídeos tinham coexistido e ele estava completamente correto, a gente sabe que foi assim que aconteceu”, conta.

Uma das imagens mais conhecidas sobre a evolução é a sequência de várias espécies, desde o macaco até o homem. Laís garante que isso não existe, “a evolução não é um processo de transformação de uma espécie para outra”. Na verdade, as várias espécies existiam juntas e compartilhavam o mesmo ambiente. O que aconteceu é que “a seleção natural agiu sobre eles”.

“Foi muito legal Haeckel ter entendido isso, o único problema foi que ele continuou achando que na sua época ainda existiam diferentes espécies de homens. Ele não considerava que todas as raças, as linhagens de todos os continentes, que eram tão diferentes, pertenciam a uma espécie só”, ressalta.

Antes da História da criação, em 1866, o cientista já havia publicado a obra “Morfologia geral dos organismos”, que acarretou na criação das disciplinas de Biogeografia e Ecologia. Outras publicações importantes foram “Esponjas Calcárias”, em 1872, em colaboração com o aluno Nikolai Miklucho; “Antropogenia”, em 1874, que fala sobre a ontogenia (desenvolvimento) e filogenia (relações de parentesco) do homem; e “As formas de arte na natureza”, de 1899 a 1904, um compilado de diversas ilustrações de diferentes grupos de organismos.

Na primeira obra, Haeckel define as 5 idades do tempo geológico, que classificou como: Primordial-Zeit, Primär-Zeit, Secundär-Zeit, Tertiär-Zeit e Quartär-Zeit. Esta última, conhecida como a época quaternária ou a Era do Homem, foi abordada em “História da criação”. Ele trata o desenvolvimento do homem e da cultura, a influência no mundo orgânico.

“Ele fala que o homem batiza uma das idades, uma das partes do tempo da Terra, não porque é um ser especial ou um ser evoluído, mas porque tem uma influência tão destrutiva e modificadora no planeta como nenhuma outra espécie tem. É isso que destaca, é isso que faz com que o homem batize esse período”, conclui Laís.

Polêmica que rende até hoje

Em hipótese criada por Haeckel, o Pithecanthropus alalus seria o primeiro homem, que nesse estágio ainda nem falava. A partir disso, o pesquisador rastreou e tentou mostrar o desenvolvimento das diferentes espécies que surgiram até o homem moderno. Para apresentar o estudo, ele criou a filogenia das espécies modernas. A polêmica surge no ponto em que ele coloca os homens brancos, europeus, principalmente, nas posições mais recentes. Enquanto em posições mais ancestrais estariam os povos de Papua-Nova Guiné, os australianos, os aborígenes.

“Isso fez com que o Heackel fosse, por alguns, considerado racista, preconceituoso. Outras pessoas acreditavam que essas ideias dele, essas construções do desenvolvimento da espécie humana, tinham contribuído para o desenvolvimento do nazismo, do fascismo, então ele foi bastante criticado”, afirma Laís.

Por outro lado, há teóricos que defendem o autor. Os principais argumentos é que ele “nunca usou isso para fazer uma hierarquização dessas espécies de um ponto de vista social, nunca falou que as espécies mais derivadas eram mais importantes ou inteligentes que as espécies da base”. Outro ponto seria o de que “junto aos organismos derivados, ele colocou tanto os brancos europeus quanto alguns judeus negros”.

Essa é uma pauta que segue em discussão até os dias atuais. “A gente ainda tem ambos os lados mostrando as duas respectivas evidências”, garante a professora.

Laís Grossel apresentou a vida e obras do pesquisador Ernst Haeckel no evento Clássicos da Geociências I, apresentado e mediado pelas professoras Renata Garbossa, Nicole Witt e Maria Eneida Fantin. A transmissão ao vivo aconteceu no dia 25.mar.2021 e segue disponível para acesso, na página de Geociências e no canal da ESE.

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Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo
Edição: Mauri König


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