Conversar sobre a masculinidade preta é preciso

Autor: Natalia Jucoski - estagiária de jornalismo

Existe a premissa de que os homens são todos iguais. Mas, a história fica diferente quando este homem é preto, já que a diferença étnico-racial se sobrepõe à de gênero. Os homens negros são os que mais são mortos pelo Estado, os que mais estão na dependência química, em situação de rua e os que mais se suicidam. Então, onde estão os privilégios masculinos para homens negros?

A masculinidade preta foi o tema debatido no programa Papo Castiço, com a participação do  pesquisador e educador social Elton Erê e apresentação da professora Joice Diaz.

Aos 34 anos, Elton ainda lembra da primeira vez que sofreu racismo, aos 9 anos em um mercado. “A dona do mercado pediu pra bater na minha blusa e falou ‘neguinho deixa eu ver a sua blusa’. Ela bateu, apalpou nos meus braços e disse que um menino parecido comigo colocava bolacha dentro da blusa e ela queria ver se não era eu”, relembra. Mas, foi apenas na adolescência que ele de fato entendeu que era tratado de forma diferente dos homens brancos, devido às batidas policiais que aconteciam na região da periferia onde morava, em São José dos Pinhais.

Na escola não foi muito diferente. Um dos episódios que ainda se lembra foi do bullying que sofreu por conta do seu cabelo black power.  A partir disso, ele começou a entender que precisava resistir e assumir mais a sua identidade enquanto pessoa negra. “Infelizmente [o aprendizado] nas questões raciais foram pela dor, o tempo todo. Foram momentos que eu não esqueço, que foi realmente triste, chato, constrangedor, mas que me fez mais forte. E eu luto exatamente para que outras pessoas não passem pela mesma situação que eu, porque é muito ruim”. Embora hoje ele tenha uma boa autoestima, ela foi construída ao longo dos anos, e não foi um processo fácil. “Isso [o racismo] faz com que as pessoas normalmente retrocedam e não avancem”, avalia.

Enquanto educador social, Elton consegue perceber a diferença de tratamento que os meninos pretos recebem perante a sociedade. Para ele, é importante ter o olhar mais cuidadoso que ele não recebeu quando era menino. O letramento racial é algo significativo e deve ser feito o quanto antes, bem como a construção de uma rede de apoio para que esses meninos negros cresçam com autoconfiança.

Outro estigma com relação aos homens pretos é que eles não devem demonstrar fraqueza, tem que dar conta de tudo, não podem sentir emoções. Então, acaba se criando um estereótipo difícil de sustentar. É preciso quebrar esse ciclo de que o homem preto deve ser forte o tempo todo, o provedor.

Seu filho Malcolm de 7 anos é um dos principais motivos pelos quais ele procura quebrar esse ciclo. Ele sempre se permite demonstrar suas emoções na frente do filho, como chorar, além de estar constantemente falando para o pequeno o quanto se orgulha dele. Coisas que à primeira vista parecem pequenas, mas que fazem toda a diferença ao longo da criação e da formação de um menino negro. “Se eu tiver que chorar, eu choro perto dele, para que ele veja ‘nossa meu pai chora’ […] Eu me permito, falo sempre pra ele ‘eu te amo filho’”, conta.

Elton segue a religião do candomblé, que é de matriz africana. Assim, todas as histórias sobre a criação do universo são centradas na região da África, então ele utiliza dessa ferramenta para que seu filho e seus alunos consigam ver o mundo com outros olhos. “Todos esses elementos que a cosmologia africana traz fazem com que a gente possa entender melhor enquanto ser. Especialmente enquanto pessoas pretas. E fazer com que a gente siga com maior naturalidade e com maior entendimento. Porque se a gente entende quem nós somos e de onde nós viemos, fica muito mais fácil”, comenta.

A reflexão sobre o papel do homem negro na sociedade é muito importante. Para isso, é preciso trabalhar com a mudança nas escolas, dentro de casa e com o Estado, para que esses homens e meninos tenham uma rede de apoio ao longo de suas vidas. “Fico feliz de poder estar dividindo um pouco sobre a minha história, porque eu acredito que a história de todas as pessoas pretas. em algum momento, se conectam. A nossa vida enquanto pessoas pretas é uma encruzilhada”, finaliza.

O Papo Castiço é apresentado por Joice Diaz e vai ao as todas as quartas-feiras às 10h pela Rádio Uninter. Você pode conferir este episódio completo clicando aqui.

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Autor: Natalia Jucoski - estagiária de jornalismo
Edição: Larissa Drabeski
Créditos do Fotógrafo: Reprodução do Instagram e Youtube


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