Como a desigualdade racial se reflete na política do Brasil

Autor: Bárbara Possiede e Igor Ceccatto - Estagiários de Jornalismo

A desigualdade racial no Brasil está relacionada a diversos fenômenos sociais e reflete o processo histórico de desenvolvimento brasileiro. Inúmeros indicadores sociais vêm sendo divulgados nos últimos anos e apontam que a cor da pele é componente central na estruturação das desigualdades no país.

De acordo com a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), realizada pelo IBGE, 56% da população brasileira se declara negra ou parda. É justamente essa parcela que vive em maior nível de vulnerabilidade econômica e social. As desigualdades raciais envolvem diferentes esferas da sociedade: acesso a educação e empregos, violência, distribuição de renda e também representação política.

A participação da população negra nos parlamentos ainda é muito restrita. Em 2018, dos deputados federais eleitos no Brasil, apenas 24,4% eram pretos ou pardos (IBGE). Mas a promoção de seus direitos passa pela mudança deste cenário.

Para debater formas de combate às desigualdades sociais, trazendo esse tema para ser abordado com sua comunidade acadêmica, os cursos de Ciência Política e Relações Internacionais da Uninter convidaram o sociólogo Wescrey Portes para uma conversa com o professor Luiz Domingos.

Portes é doutorando da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP/UERJ), onde desenvolve pesquisa sobre relações raciais e racismo, e tem estudado a inserção de negros e negras na competição eleitoral municipal na câmara de vereadores do Rio de Janeiro.

Ele aponta que o sistema eleitoral brasileiro estabelece que qualquer pessoa tem direito a voto e pode se candidatar, desde que não haja nenhum problema jurídico, mas alerta que a composição do parlamento hoje não traduz a realidade demográfica brasileira, na qual negros e mulheres são maioria.

“A política brasileira como um todo é dominada por homens brancos de meia idade e classes abastadas, geralmente com o ensino superior, com alto patrimônio, deixando de fora diversos atores sociais que teriam muito a contribuir com a nossa democracia”, afirma.

Muitas pessoas podem pensar que “isso faz parte do jogo”, que cada um é livre para escolher em quem votar, portanto isso seria uma decisão individual e garantiria a democracia. Mas Portes explica que seu papel como pesquisador é questionar se isso de fato é uma realidade, para entender se existe essa igualdade de condições capaz de democratizar a política e nossas instituições.

De acordo com ele, ao analisar a competição eleitoral é possível perceber que os negros participam do processo. Nas eleições de 2016, 49% dos candidatos eram pretos e pardos. No entanto, isso não se mantém no resultado das eleições, já que homens brancos se elegem muito mais do que qualquer outra categoria social, chegando a ter cerca de 40% das cadeiras no país todo.

Para Portes, alguns aspectos explicam este cenário: “processos estruturais somados a uma história de discriminação racial vão moldando as possibilidades de acesso de um grupo. A maioria dos pretos e pardos têm uma experiência de vida que remonta a uma história de pobreza. Eles vêm de um lugar pobre e tem que galgar espaços. Essa relação se reflete também no sistema eleitoral. Isso faz com que a participação deles já entre de um lugar de desigualdade material”.

O pesquisador defende também que a dificuldade de inserção dos negros não é exclusiva de um partido. Dentro das estruturas partidárias existem inúmeras posições responsáveis por tomadas de decisões importantes, mas os negros e negras não estão nesse lugar de controle. 

Motivação dos negros na política

Quando questionado sobre a falta de motivação dos negros para atuar na política, ele esclarece que este pensamento está atrelado a uma construção histórica sobre a passividade do negro no processo de exercício de sua cidadania. É algo que parte da imagem de passividade construída no processo escravocrata, quando se assume que o negro não se revoltava contra o regime no Brasil tanto quando em outros países.

Mas Portes explica que essa é uma concepção equivocada que faz parte de um senso comum, e que pesquisas apontam que o negro está participando da política do Brasil em todas as dimensões, inclusive se candidatando.

“Não existe disparidade entre o número de negros na sociedade e a aceitação dos negros enquanto candidatos dentro dos partidos. O problema não é o negro querer ou não participar da política, o problema é que existem filtros que ultrapassam a vontade. Como acessos aos recursos para campanhas, acessos a burocracias partidárias e desigualdades profundas da sociedade brasileira que não permitem que os negros acessem tecnologias típicas da disputa eleitoral, como as universidades”, reforça.

Sobre o tema, o professor Luiz conclui: “Com a disparidade de origem econômica e educacional que os negros têm em relação aos brancos e com a desigualdade em relação aos recursos para disputar a campanha, a vontade deles é provavelmente muito maior, porque já sabem que eles largam atrás e mesmo assim estão ali para tentar mudar a estrutura e criar condições para as próximas gerações”.

Para conferir o bate papo na íntegra, acesse o link.

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Autor: Bárbara Possiede e Igor Ceccatto - Estagiários de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Christina Morillo/Pexels e reprodução Facebook


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