Ciências humanas e exatas dialogam para construir uma sociedade melhor

Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo

As ciências humanas e as ciências exatas são entendidas como áreas distintas, já que uma trabalha a partir de análises empíricas e a outra por meio de estudos teóricos e reflexões. Mas elas também dialogam entre si. Ainda que possa existir uma disputa por status científico entre ambas, a verdade é que, partindo do percurso histórico de construção destes conhecimentos, elas não começaram separadas.

No contexto do momento atual, devido à pandemia da Covid-19, muitos acreditam que as exatas têm maior relevância na procura por uma solução. Mas, segundo a professora Denise Wolski, do curso de Matemática da Uninter, as decisões que precisam ser tomadas para o encaminhamento de uma resolução não podem ser tomadas por pessoas que não tenham formação humana, que ignorem os princípios dos direitos humanos, de dignidade. Portanto, as duas áreas devem caminhar sempre juntas.

De acordo com Luis Fernando Lopes, professor dos cursos de Pedagogia e Filosofia, as discussões que são geradas hoje em torno do assunto são muito mais ideológicas, com o intuito de ocupar espaço e garantir verbas. Essa situação, para ele, é extremamente problemática, pois são pensamentos como esses que trazem à tona o negacionismo da ciência como um todo, por exemplo.

“Dicotomizar a ciência, entre humanas versus exatas, é prejudicial para ambas as partes. Porque a ciência é experimentação, observação, criação de leis gerais, produção de instrumentos, produção de objetos. Conhecemos mais para que o ser humano tenha uma vida melhor”, ressalta.

Valéria Pilão, professora da área de Humanidades da Escola Superior de Educação (ESE) da Uninter, lembra que a consolidação da ciência moderna, com o processo de racionalização e especialização do conhecimento, pode ter colaborado para o distanciamento entre as duas áreas.

“Quando nós ingressamos na escola, nós aprendemos a matemática completamente distinta e distante da história, da filosofia, da geografia, da física. Inclusive, até as exatas ficam distantes, parece que são coisas que não dialogam”, afirma.

Reaproximação da matemática com as outras disciplinas

O movimento da educação matemática surge como uma forma de transformar o ensino rigoroso e tradicionalista, se constituindo a partir de conhecimentos matemáticos e da educação. A prerrogativa é “educar por meio da matemática”, explica a professora Denise.

“A educação matemática vem justamente para quebrar a matemática separada das outras disciplinas, trazer a matemática junto, com a mesma força, com a mesma importância que as outras disciplinas. Inclusive, não trabalhando para se colocar com uma carga horária maior, com um currículo maior, nada disso. Mas para fortalecer as outras disciplinas”.

A profissional cita algumas áreas em que a ciência dos números se integra com outras áreas mais sociais, como a etnomatemática, que aborda a multiculturalidade do aluno e o ambiente onde está inserido, trabalhada por Ubiratan D’Ambrosio. Assim como a história, filosofia e educação matemática, abordadas por Antonio Miguel. Ensinos que vão além do convencional, trazendo uma nova visão sobre a matemática.

“São pessoas que vêm há algum tempo trabalhando para transformar essas relações da matemática dentro da escola, aproximar ela das outras relações”, salienta Denise.

Ampliação dos campos da história

Após a Segunda Guerra Mundial, os pesquisadores e intelectuais europeus começaram a perceber que estava acontecendo uma inversão da pirâmide etária, com baixo índice de natalidade e aumento da população idosa. Com isso, veio a preocupação com um despovoamento da Europa e começou-se a fazer buscas para descobrir se aquele fenômeno já tinha acontecido em algum outro momento da história.

Mesmo que no início do período moderno ainda não se pensasse em estatísticas, a população se preocupava com o espiritual e havia registros de batismos das crianças. Assim, criou-se a demografia histórica para estudar séries de registros populacionais dos antecedentes. Entre as décadas de 1960 e 1970, começaram a ser produzidas teses compilando dados de natalidade, falecimentos e casamentos de eras antigas.

Com essa ampliação, inicia-se um movimento historiográfico chamado “Escola dos Annales”, que prevê o diálogo de historiadores com outras disciplinas. Desta forma, surge um debate acerca do campo quantitativo, se ele seria mais “científico” do que as outras áreas da história.

“Depois desse debate em classificar o que é mais científico, se é uma história feita com base em números ou uma história feita com base em outro tipo de documentação, o que hoje acontece é uma linha de conciliação. Muitos historiadores não abriram mão de séries estatísticas, mas passaram a sofisticar, a acrescentar análises teóricas utilizando essas séries estatísticas como ponto de partida e não simplesmente como um ponto de chegada”, afirma o professor André Cavazzani, do curso de História da Uninter.

André trabalhou pesquisando populações portuguesas da região do Paraná e reconstituiu a vida de muitas pessoas que migraram para o Estado entre os séculos 18 e 19. “O entendimento do número de portugueses que viviam em Paranaguá me deu um arco teórico para entender aquela população de uma maneira que se eu não tivesse esses números, se eu não tivesse essas estatísticas, seria impossível”, completa o historiador.

Os profissionais debateram acerca desses assuntos durante o 11º Café com Sociologia, que teve como  tema O diálogo entre as ciências humanas e exatas.

“A gente precisa estudar a construção do conhecimento, tem que trazer essa parte da epistemologia para entender por que as coisas estão com essa configuração de ciências humanas e ciências exatas e ainda muitas vezes há essa dualidade. A medida que eu compreendo o porquê de as coisas estarem estabelecidas desta forma, eu posso contribuir para transformar isso”, salienta Denise.

O bate-papo foi mediado pela professora Valéria Pilão, que afirma que a mais recente edição do evento sela a tentativa de pensar a realidade como uma totalidade não fragmentada, buscando a melhor compreensão possível.

“Se por um lado a gente faz escolhas, em que uma ciência é melhor que a outra e fica nessa disputa, há uma tendência muito comum de negar outras linguagens, negar as artes, a poesia, a literatura. E nós não podemos esquecer que a arte como um todo também é uma forma de compreensão e, portanto, de explicação da realidade. Nós não devemos fazer essas escolhas, elas são tolas, porque acaba nos fazendo fazer escolhas que nos impedem de compreender o mundo com outros olhares, com outras perspectivas e com outras linguagens”, finaliza.

A transmissão permanece disponível para os interessados na página de Humanidades da ESE.

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Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Pixabay e reprodução Facebook


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