Candidaturas femininas no Brasil enfrentam obstáculos sociais e eleitorais

Autor: Arthur Salles – Estagiário de Jornalismo

A cada eleição aumentam as expectativas sobre a participação feminina em cargos públicos. A população e o eleitorado brasileiro são compostos em sua maioria por mulheres, mas essa proporção ainda está longe de se ver representada na política.

Mesmo assim, o Brasil atingiu um recorde neste ano: 187 mil mulheres lançaram-se à disputa eleitoral. O número representa um terço do total de candidaturas registradas no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e um ligeiro aumento sobre as 158 mil postulantes em 2016. A distância para os homens é grande, e a doutoranda em Ciência Política pela UFPR (Universidade Federal do Paraná) Geissa Franco enxerga a equiparação chegando a passos lentos.

A politóloga, egressa dos cursos de Ciência Política e Secretariado Executivo da Uninter, comentou sobre o tema da representação eleitoral feminina no continente americano. A fala aconteceu em live realizada pelo curso de Relações Internacionais, com mediação do professor André Frota e transmissão pelo Facebook em 30.nov.20.

A proporção de prefeitas e vereadoras eleitas em 2020 ainda é praticamente a mesma das eleições municipais anteriores. Neste ano, as mulheres ocupam 12,2% dos cargos executivos, contra 11,6% em 2016. Nos cargos legislativos, elas passaram de 13,5% há quatro anos para 16%.

Os dados são semelhantes no Congresso Nacional. De 513 deputados federais, o pleito de 2018 elegeu 77 mulheres (15%). Já no Senado o número é de 12 senadoras entre as 81 cadeiras (14,8%).

Entre 193 países reconhecidos pela ONU (Organização das Nações Unidas), o Brasil é o 140º na classificação de representação feminina em cargos públicos. A média global verificada em janeiro pela organização é de 25%.

Como forma de superar esses índices, o Brasil adota desde 2009 as cotas compulsórias que definem o mínimo de 30% para candidaturas de cada sexo. O TSE ainda passou a exigir em 2016 que pelo menos 30% dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha fossem direcionados às concorrentes mulheres. Nem mesmo a normativa pôde ser garantida neste ano, já que até o dia 5.nov, a 10 dias das eleições, 22 dos 32 partidos brasileiros repassaram menos verbas que o devido para as candidatas. O levantamento é do portal G1.

Outro aspecto a ser considerado no número de mulheres candidatas é o uso de “laranjas”. A prática consiste em suprir nos partidos a cota de candidaturas femininas com nomes que não recebem votos ou que são inexpressivos. Em 2016 o TSE aferiu que 16.131 candidatos não obtiveram sequer um voto, dos quais 14.417 eram mulheres (quase 90%).

Geissa entende que o campo político é um reflexo das práticas sociais que o Brasil enfrenta desde sempre. “Existem certas barreiras institucionais, culturais e sociais que fazem com que as mulheres não consigam ser tão eleitas”, diz.

Essas adversidades, para ela, são ainda mais incisivas pelas regras eleitorais brasileiras. O sistema proporcional de lista aberta permite ao eleitor a escolha de qualquer candidato apto para receber seu voto, e nesse quesito a cultura histórica de dominação do homem sobre a mulher também pode ser notada.

A defesa da especialista é de um modelo proporcional de lista fechada, no qual o partido classifica internamente os candidatos que o representarão. O eleitor passaria a votar no partido e não mais na pessoa. Com o número de votos, cada sigla distribuiria seus cargos conquistados aos nomes mais bem posicionados na lista.

“Gostemos ou não, o partido é a instituição que representa as pessoas. Como delegamos aos deputados, vereadores, o direito de nos representar, se o partido não estiver fortalecido, isso vai impactar diretamente nas decisões de políticas públicas e como o sistema vai funcionar”, comenta a pesquisadora.

A garantia de que as mulheres ocupariam lugares equilibrados com os homens seria a alternância consecutiva entre os gêneros. O sistema leva o nome de “lista zebrada”, em que um nome masculino é sucedido por um feminino, esse por outro masculino e assim por diante.

Esse exemplo pode ser verificado na Bolívia. O país é um dos modelos de comparação de Geissa em sua tese, uma vez que é a nação latino-americana com o maior número de mulheres no congresso. Sendo gestada há anos pelo MAS (Movimento ao Socialismo), partido do ex-presidente Evo Morales e do atual Luis Arce, a política de “paridade e alternância” colocou as mulheres em 20 das 36 cadeiras do Senado (56%) e 62 das 130 da Câmara (48%).

“Eu acho que a formatação do próprio sistema eleitoral de ser proporcional, de lista aberta, desfavorece as mulheres. A forma como os partidos tratam as mulheres na questão do seu recrutamento também impacta muito nisso”, diz Geissa, ao defender o modelo boliviano. “É um país que, nesse quesito de pensar o nosso sistema eleitoral brasileiro, a gente poderia tirar vários aprendizados com ele.”

A transmissão pode ser conferida na íntegra aqui.

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Autor: Arthur Salles – Estagiário de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro


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