Artesanato empreendedor: a feira de rua ocupa a sala de aula e vira livro

Autor: Poliana Almeida - Estagiária de Jornalismo

A famosa Feirinha do Largo da Ordem, no centro histórico de Curitiba (PR), tem muita história para contar.  A feira de artesanato, como é conhecida, começou a ter importância na região central da capital paranaense na década de 1960, quando um grupo de artistas populares se instalou na Praça Zacarias. Seu grande objetivo era valorizar a cultura e começar a divulgar a arte produzida por eles.

No começo, ela não contava com apoio governamental. Ao longo do tempo, a administração do evento, promovido por artistas e artesãos, foi passando por vários órgãos da prefeitura. Inicialmente, ficou a cargo da Fundação Cultural de Curitiba, que depois passou o bastão para a Secretaria Municipal de Indústria, Comércio e Turismo. O evento teve ainda uma pequena passagem pela Fundação de Ação Social de Curitiba. Quem fixou a feira no Largo da Ordem foi o IPPUC (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba). Atualmente, a feira é coordenada pela Secretaria de Turismo e todos os participantes são devidamente cadastrados.

O professor Eduardo Antonio Bonzatto e a professora Naja Kayanna Polichuk estudaram a fundo a origem da feira. O trabalho intitulado Origem da feira do largo da ordem, Curitiba, em 1970: diálogos de arte e zanato revela que a feira do Largo é fruto da união de várias outras feiras. Entre elas estão a Feira da Praça Zacarias, a da Praça Tiradentes e o Mercado das Pulgas, no próprio Largo.

De acordo com o último levantamento, o fluxo de visitantes da feira nas manhãs de domingo é de cerca de 15 mil pessoas. Pode-se encontrar uma grande variedade de produtos artesanais, comidas típicas, obras de arte, itens para escritório, roupas etc. Há quem frequente o local apenas por lazer e, com isso, consiga aprender um pouquinho mais da cultura curitibana só andando pelas ruas.

Com a pandemia do novo coronavírus, o evento sofreu algumas adaptações. Os 1.750 artesãos que dependiam do movimento nas ruas também migraram para o ambiente virtual. A vitrine online, como é conhecida, foi uma iniciativa da prefeitura e do Instituto Municipal de Turismo, visando maiores possibilidades de vendas para esses trabalhadores. Para conhecer a plataforma da feira basta clicar aqui.

E o que une tantas pessoas no mesmo lugar para trabalhar? A veia empreendedora. Em busca do pão de cada dia, eles decidiram abrir o seu próprio negócio. Para ficarem de acordo com a normal tributária, a grande maioria opta por ser MEI – microempreendedor individual. E foi justamente esse conjunto de empreendedores que se tornou objeto de pesquisa de um trabalho desenvolvido por alunos do curso de Administração da Uninter.

De olho na feira

Todos os alunos da Uninter precisam realizar um trabalho prático ao final de cada quadrimestre. No curso de Administração esta tarefa se chama PBL (Project Based Learning), ou projeto baseado na aprendizagem, na tradução literal.

Um dos PBLs que os alunos teriam de desenvolver era sobre uma pesquisa com microempreendedores. O objetivo era ofertar uma mini consultoria para esses profissionais. Entretanto, muitos estudantes estavam com dificuldades em achar pessoas que trabalhavam como MEIs. Foi aí que o professor Julio Cezar Bernardelli teve uma grande ideia.

Bernardelli sugeriu aos alunos que fossem dar uma volta pela conhecida Feira do Largo da Ordem, o que situação aconteceu há dois anos, antes de entrarmos em quarentena.

Lá, os 36 estudantes encontraram centenas de microempreendedores e puderam desenvolver um trabalho interessante com eles. O sucesso foi tanto que no dia da apresentação eles convidaram os artesãos, feirantes e demais pessoas envolvidas no projeto para participar da apresentação no auditório do campus Tiradentes.

O trabalho teve um impacto duradouro na vida daquelas pessoas. “Depois daquele dia, recebi vários comentários de pessoas que não conheciam a realidade daqueles trabalhadores. Muita gente passeia por lá, mas nem sequer pensa em como eles se mantêm no dia a dia”, declara.

De professor para aluno

Ao perceber que pouca gente sabia de fato como funcionava esse backstage de quem trabalha na feira, o professor decidiu investigar mais a fundo, e então deu início ao seu mestrado na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFP). O tema da pesquisa? Os próprios feirantes.

A ideia do mestrando, na época, era estudar a relação das tecnologias com a sociedade. Ele considera que tecnologias não são apenas os smartphones e tablets que conhecemos hoje. “Tecnologia, neste recorte de estudo, também são os martelos, formões entre outras ferramentas utilizadas pelos trabalhadores da feira”, exemplifica.

As relações sociais envolvidas naquele processo de trabalho também foram analisadas. Ou seja, além de olhar para o fazer diário dos produtos que iam ser vendidos, Bernardelli também queria entender as histórias de vida daquelas pessoas.

Para realizar essa proposta dentro dos moldes acadêmicos, o professor se valeu de alguns processos metodológicos, tais como: pesquisas qualitativa e quantitativa, método de observação e entrevistas dirigidas.

Além disso, ele acompanhou por um período a rotina de quem ia todo dia para a feira. “Pude conhecer desde o início do trabalho, como a seleção das matérias primas, até a venda do produto final”, relembra.

O resultado do trabalho de mestrado do coordenador foi a publicação de um livro virtual e gratuito,  intitulado O artesão da Feira do Largo da Ordem: quem é esse trabalhador?, escrito em parceria com a pesquisadora Maria Sara de Lima Dias. A obra conta com 17 personagens. Vale ressaltar que foram 26 feirantes acompanhados pelo professor, mas o número foi reduzido no livro, pois os participantes foram separados em grupos. “A seleção aconteceu conforme o tipo de trabalho realizado”, complementa Bernardelli.

O docente faz questão de lembrar do apoio recebido por alunos e professores da Uninter. “Foram os alunos que me inspiraram a fazer essa pesquisa. O vice-reitor da Uninter, Jorge Bernardi, também. Afinal, ele tem um elo com a feira. Foi lá que ele conheceu sua esposa”, conta. Bernardi, inclusive, é o autor do prefácio do livro.

Quando perguntado sobre os próximos passos, Bernardelli projeta mais interações com os trabalhadores da famosa feirinha. “O próximo passo é fazer o livro impresso. Também quero entrar no doutorado e continuar a minha pesquisa. Sou apaixonado por histórias de vida e lá tem muitas para contar”, concluiu.

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Autor: Poliana Almeida - Estagiária de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Arquivo pessoal Julio Cezar Bernardelli


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