Aos negacionistas da vacina, um alerta: ela já nos salvou muitas vezes

Autor: Vitor Diniz - Estagiário de Jornalismo

O Brasil faz campanhas de vacinação há mais de 2 séculos. No ano de 1804 ,chegava ao Brasil a vacina contra a varíola, doença infecciosa que só foi extinta após a realização de uma campanha de vacinação de escala global. De lá para cá, tivemos no Brasil diversas ações para promover a vacina como um instrumento de saúde pública.

Entre esses acontecimentos, tivemos a criação da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Rio de Janeiro, e do Instituto Butantan em São Paulo. Tivemos a implantação sistemática de vacinas contra várias doenças, e até a criação do personagem “Zé Gotinha”, que ficou famoso em comerciais de televisão que incentivavam os pais a levarem as crianças até o posto de saúde para serem vacinadas.

No início dos anos 2000, o país instituiu calendários de vacinação para crianças, adultos, idosos, e também um calendário específico para os povos indígenas. O Sistema Único de Saúde (SUS), desde a sua criação, em 1988, assumiu o papel de realizar a vacinação em massa, considerando que grande parte da população brasileira não teria condições financeiras para comprar vacinas.

Todo esse esforço está amparado pelo consenso científico de que vacinas salvam vidas. Ainda assim, ouvimos relatos de pessoas que declaram ter medo de tomar vacinas e que acreditam em malefícios que supostamente seriam causados por elas.

Para desmistificar algumas dessas crenças, sobretudo para falar da importância da vacina contra a Covid-19, a Central de Notícias Uninter (CNU) entrevistou o biomédico Benisio Ferreira Filho. Habilitado em análises clínicas e genética e doutor em Biotecnologia, ele coordena o curso de Biomedicina da Uninter. Confira abaixo a entrevista que ele concedeu à CNU.

 CNU: A vacina contra a Covid-19, ou qualquer outra vacina, pode apresentar riscos à saúde?

Benisio Ferreira Filho: É muito mais fácil existir uma grande quantidade de efeitos colaterais por conta do uso incorreto de medicamentos do que numa simples punção com vacina. O máximo que pode acontecer com o recebimento da vacina é você apresentar uma reação, que na grande maioria dos casos é a dor de cabeça e a febre. Se for uma vacina desenvolvida com atenuação do vírus em ovos, os alérgicos ao ovo vão desenvolver uma reação alérgica, pois a vacina contém proteínas do ovo. Mas no geral ninguém vai se prejudicar porque tomou uma vacina, ela pode causar um pouco de dor no local de aplicação da seringa, pode gerar um pouco de febre e dor de cabeça em poucos casos, mas alguém morrer por causa de uma vacina, isso não existe. A produção da vacina não permite uma superdosagem, quando a vacina sai dos laboratórios de produção e vai para as unidades de saúde que imunizam a população, a ciência já sabe qual é a dose que estimula o sistema imune à produção de anticorpos.

CNU: Qual é a função da vacina? Tem efeitos diferentes, se comparada aos remédios?

Benisio: A vacina não é um remédio. Quando você tem uma doença, toma um remédio, e ele cura a doença. Já a vacina é uma forma profilática, é uma prevenção para que a pessoa não desenvolva a doença, então ela tem uma outra dinâmica de aplicação e deve ser aplicada em massa. As doenças que necessitam de uma vacina são doenças que têm uma disseminação muito rápida, e que causam alguma gravidade. Então, a forma de evitar que a doença se espalhe é fazendo com que um grande número de pessoas fiquem imunes à doença.

CNU: Teremos que tomar a vacina da Covid-19 nos próximos anos? A fórmula será sempre a mesma?

Benisio: Alguns vírus, como o vírus da AIDS, por exemplo, apresentam uma taxa de mutação tão alta que se torna mais difícil desenvolver uma vacina, mas em breve teremos vacina para o vírus da AIDS também. Já os vírus que mantém uma taxa de mutação mais baixa, contra esses vírus temos vacina, mesmo que essa vacina seja anualmente atualizada. Quando é descoberta uma nova cepa do vírus, essa informação é incluída pela ciência, atualiza-se a vacina e continuamos vacinando a população. E existem vírus com taxa muito baixa de mutação, que uma dose única é a solução, não precisando ser atualizada. São exemplos disso a vacina da febre amarela e da poliomielite, você não tem esse tipo de atualização anual para o vírus influenza que inclui até o H1N1. Hoje poliomielite é coisa de livro de história, dificilmente temos nos dias atuais pessoas com alguma deficiência física por sequelas da poliomielite, e isso se deve à vacinação.

CNU: Já tivemos anteriormente por parte da população brasileira uma resistência às vacinas, ou isso é algo específico da pandemia da Covid-19?

Benisio: Em outras décadas aqui no Brasil houve resistência por parte da população em receber algumas vacinas, e isso aconteceu justamente pela falta de informação. Tem aquela famosa “revolta da vacina” (1904), quando aconteceram muitas reações, brigas, as pessoas tinham as suas casas invadidas etc. É a prova de que a falta de conhecimento e uma má comunicação causam dúvida e pânico nas pessoas. A gente tem que saber divulgar, vacina é importante, não faz mal às pessoas, e indiscutivelmente é importante que todos sejam vacinados.

CNU: Por qual motivo existem pessoas que ainda não acreditam que a vacina pode salvar vidas nessa pandemia?

Benisio: Em relação ao grupo de pessoas que desacreditam, a verdade é que houve na década de 1980 uma publicação que correlacionava uma determinada vacina com autismo. A publicação não descreveu a fisiopatologia do uso da vacina para gerar autismo. Isso foi publicado, e posteriormente desmentido pela comunidade científica, e principalmente pelos autores do artigo, mas isso ninguém leva em consideração, pois algumas pessoas preferem ter algum tipo de conspiração para discutir. Devido a essa publicação, parte da população ainda acredita que a vacina pode causar alguma coisa que a gente não sabe o que é. Nós, profissionais da área da saúde, sabemos o que a vacina causa, nós temos mapeado todo o genoma humano, a gente conhece cada uma das funções das células do sistema imune, a produção molecular dos anticorpos, e o estímulo celular, isso não se discute mais. Se as pessoas tivessem recebido uma educação adequada, não iriam questionar alguns pontos científicos.

CNU: Existe a possibilidade de a vacina contra a Covid-19 mudar o DNA das pessoas?

Benisio: Trabalho na área da biologia molecular, meu doutorado é em biotecnologia, eu afirmo: não existe nenhum mecanismo molecular que faça o carreamento do RNA mensageiro no sentido reverso, do citoplasma para o núcleo. Afirmar que é possível alterar o genoma humano com uma tecnologia de produção das vacinas que utilizaria o RNA mensageiro é no mínimo falta de caráter de quem faz essa afirmação. Todos os alunos da área de saúde estudam as disciplinas de biologia molecular e celular, genética e bioquímica. Se um aluno estudou essas disciplinas e não entendeu que vacinas não alteram o DNA, então o aluno deve repetir as disciplinas.

CNU: São casos isolados, mas existem médicos que já publicaram nas redes sociais explicações de que a vacina da Covid-19 é ineficaz no combate ao vírus. O que você tem a dizer sobre isso?

Benisio: Se você quiser informações precisas sobre nutrição, deve consultar um nutricionista. Se precisar de informações precisas sobre um medicamento, consulte um farmacêutico. As informações precisas sobre um exame laboratorial, como ele foi feito e o porquê, são apresentadas por um biomédico. Em um tratamento de fisioterapia é necessário passar por um fisioterapeuta. O médico clinica, isso não se questiona, mas isso também não faz dele soberano nas informações.

CNU: Existe uma discussão na sociedade sobre o tempo em que a vacina contra a Covid-19 foi desenvolvida, algumas pessoas acreditam que 1 ano é pouco tempo para desenvolver uma vacina eficaz. Podemos confiar na eficácia da vacina que foi desenvolvida nesse prazo?

Benisio: Com a nossa tecnologia, 1 ano é um tempo adequado. Todas as tecnologias usadas na criação da vacina contra a Covid-19 não foram criadas no ano de 2020. Todas as tecnologias usadas para a criação da vacina já existiam. O ano de 2021 é o ano da fase 4 dos testes, o ano de 2020 foi a fase 3, quando foram feitos os testes em grupos fechados. A fase 4 dos testes é para um grupo maior de pessoas e continua-se a mesma observação da fase 3. Para abrir a fase 4 foi preciso termos os testes das fases 1, 2, e 3, com resultados de segurança para uma grande população.

CNU: Por quê se orienta os vacinados a continuarem usando máscara?

Benisio: Para ter um cuidado com os demais. Quando você recebe a vacina, você produz anticorpos contra o vírus. Então quando o vírus entra no seu corpo ele não consegue infectar suas células e debilitar você, mas ele está presente. Então o vacinado não desenvolve a doença, mas continua sendo o transmissor do vírus.

CNU: É correto que cada estado compre lotes da vacina, ou é melhor que o governo distribua as doses da vacina por igual, levando em conta a proporção da população de cada estado?

Benisio: Se alguns municípios comprarem mais vacinas para imunizar toda a população local, alguns estados brasileiros vão continuar desassistidos e nós veremos muitas pessoas morrerem, pois alguns municípios podem comprar mais vacinas do que outros. Nós temos que parar a disseminação do vírus, enquanto tivermos um ponto de disseminação no país, a gente ainda não está sob controle. A vacina deve ser distribuída por igual, proporcional ao número de habitantes de cada localidade, isso é uma estratégia de contenção epidemiológica, não podemos estabelecer diferenças.

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Autor: Vitor Diniz - Estagiário de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Artem Podrez/Pexels


1 thought on “Aos negacionistas da vacina, um alerta: ela já nos salvou muitas vezes

  1. Parabéns, matéria importante, pena não chegar em negacionistas. São eles quem vão fazer a pandemia durar ainda mais senão colocarem restrições e os isolarem. Ou obrigam, ou isolam. Liberdade é quando não interferimos no outro.
    #vacinaja
    #VivaoSUS
    #orgulhoSUS

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