Como nascem as fake news, quais conflitos geram e como combatê-las?

Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo

O termo fake news, designado para a disseminação de notícias falsas, se popularizou nos últimos anos, principalmente depois das eleições estadunidenses para presidente em 2016. Na época, empresas especializadas na produção e divulgação de dados que distorcem a realidade foram apontadas como colaboradoras para a eleição de Donald Trump. Isso se deve à força das redes sociais e ao avanço tecnológico que permitiu a criação de robôs que possibilitam a publicação em massa, atingindo milhões de pessoas por todo o mundo.

No Brasil, algo semelhante aconteceu em 2018 na eleição de Jair Bolsonaro. Desde então, as fake news ganham cada vez mais notoriedade. A pandemia do novo coronavírus também é um exemplo claro e atual deste movimento, com a divulgação frequente de notícias falsas a respeito do Covid-19. Mas a verdade é que a divulgação de boatos distorcidos ou completamente mentirosos sempre existiu. “Notícias falsas, querendo ou não, fazem parte das sociedades humanas”, diz Fernanda Haag, professora de História da Uninter.

“A ideia de você criar uma notícia falsa é basicamente você deslegitimar o opositor ou legitimar o seu discurso enquanto detentor do poder. Em vários momentos da história, em várias civilizações, em várias sociedades vai existir esse jogo de construção de realidade, de construção de discursos que vão ser legitimados hora com uma visão deturpada da realidade, hora com uma mentira escancarada”, explica o professor de Letras Gladisson Silva.

Ao longo da história, desde o início dos séculos, várias realidades e discursos foram sendo construídos por pessoas ou instituições que ocupavam o podem para assim mantê-lo ou então para controlar a população através da manipulação de ideias e pensamentos. Fernanda cita períodos históricos como a Inquisição Francesa, na Idade Média, que combatia a heresia e que utilizava de falsas histórias como respaldo para conseguir a condenação do acusado.

Gladisson relembra o período de caça às bruxas, quando o livro Malleus Maleficarum, visto como manual de rituais, foi base para incriminar acusadas de bruxaria, o que era “completamente falso”. Ao falar sobre o Protocolo dos Sábios de Sião, documento conspiratório que alega um projeto de judeus para dominação mundial, o professor diz que “o antissemitismo é o grande centro das notícias falsas”, o que “pode representar um perigo enorme para uma sociedade, para um povo inteiro”.

Para o profissional, fake news são altamente racionalizadas no momento de produção e divulgação, mas não dialogam com quem as recebe no sentido intelectual, de conhecimento. “Elas mexem com paixões, você acredita naquilo não porque faz sentido, você acredita naquilo porque é o que você gostaria que fosse verdade”.

Da mesma forma que inverdades são transmitidas como a realidade, muitas vezes um fato real é dado como mentiroso para que não impacte a população de forma negativa, para “abafar” o caso. Isso aconteceu no final da Segunda Guerra Mundial em relação aos campos de concentração alemães que mataram milhões de judeus entre os anos de 1939 e 1945.

“Era uma verdade tão triste, tão horrível, que as pessoas que contavam que tinham visto esses campos de concentração eram desacreditadas. Foi transformada em mentira, porque havia uma recusa das pessoas de acreditar naquilo”, conta Gladisson.

As notícias falsas também foram úteis a muitos regimes autoritários brasileiros. Em 1937 começou a ser divulgado o chamado Plano Cohen, outra teoria da conspiração que alegava existir um plano de dominação comunista em território nacional. Getúlio Vargas usou isto como respaldo para decretar Estado de Guerra e começar uma perseguição a comunistas e opositores políticos. No mesmo ano, ele implantou o Estado Novo e deu início à Era Vargas, que só se encerraria em 1945.

Segundo a professora Fernanda, é necessário contextualizar cada um dos exemplos de acordo com os respectivos períodos, e hoje “a gente vive em um mundo acelerado, a produção de notícias ou de informações é muito alta”. Para ela, o grande desafio atualmente é criar um filtro para que se possa averiguar se determinado fato é válido, se é legítimo e tem respaldo verdadeiro para tal.

“Se é uma coisa que mexe muito com a gente, aí que a gente precisa ter mais cuidado ainda, porque isso envolve questões políticas, questões ideológicas, questões do dia a dia, tudo isso. Eu acho que é a necessidade de desenvolver um senso crítico, a gente precisa entender e contextualizar de onde veio aquela notícia, quem fez, quais eram os interesses por trás. A gente precisa burilar aquilo para depois passar para frente”, aconselha.

As fake news no meio acadêmico

Os profissionais pontuam uma importância e atenção ainda maior em relação a referências e utilização de informações em trabalhos acadêmicos, a apuração e checagem de fontes em trabalhos acadêmicos e artigos científicos. Segundo Gladisson, esse é o ponto principal e que leva o desenvolvimento dessa produção ao crédito ou descrédito.

“É importante no trabalho acadêmico você saber de onde estão vindo suas informações. Se eu basear toda a minha pesquisa em dados não confiáveis, a minha pesquisa não é confiável, não tem sustentação. Eu preciso me cercar de fontes confiáveis para que a minha pesquisa seja devidamente confiável. É importante esse mapeamento de fontes com credibilidade”, salienta.

Fernanda e Gladisson fazem uma observação sobre o período de pós-verdade e anti-intelectual que pode ser notado na atualidade, com a imprensa sendo vista como não confiável.

“Se a gente não confia em nada, automaticamente a gente acaba confiando em qualquer coisa. Isso para quem manipula dados, para quem quer que você acredite em alguma coisa, é muito bem-vindo. A gente tem hoje várias ferramentas para se manipular a opinião pública. Isso é perigoso. A gente vive em bolhas digitais e a manipulação da realidade acontece de uma maneira muito vertiginosa”, alerta Gladisson.

Fernanda acredita na combinação de ciência e educação neste combate. “A gente precisa bater na tecla e sempre fazer uma defesa da ciência. A importância do conhecimento científico, de você ter uma produção legítima é muito fundamental. A gente precisa dar respaldo tanto para a ciência quanto para a educação no combate a essa onda de fake news, porque são elas que vão formar senso crítico, informações confiáveis, legitimidade para todo esse processo”.

Esses e outros tópicos sobre o assunto foram abordados pelos professores em uma live que aconteceu através da página do Facebook de Linguagens e Sociedade da Uninter, com o tema Linguagens e história em tempo de fake news. A transmissão ainda contou com a participação das professoras Elisa Costa e Edna Haboski, orientadoras educacionais do polo Carlos Gomes da Uninter.

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Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Connor Danylenko/Pexels e reprodução Facebook


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