Uma rebelde estelar

Autor: *Daniel Guimarães Tedesco e Graziele Aparecida Correa Ribeiro

Cecilia Payne-Gaposchkin no trabalho

Vamos começar o texto com um belo clichê: a vida é um eterno aprendizado. Falamos isso de coração, como um incentivo e também uma crítica. Apesar do avanço da participação feminina nas ciências, a disparidade persiste. Na Física, as contribuições femininas são escassas, com nomes como Marie Curie e Emily Noether surgindo à mente de prontidão.   

Recentemente, descobrimos a notável contribuição de Cecilia Payne-Gaposchkin, uma mente brilhante que desafiou o status quo ao revelar a composição das estrelas, revolucionando a astronomia. Ela se autodenominou uma rebelde contra o papel imposto às mulheres, enfatizando que sua verdadeira revolta era contra a subestimação e o tratamento como inferior. Na sua triste e clichê história de superação quase cinematográfica, teve que enfrentar o ambiente machista. Sim! O ambiente acadêmico era machista e continua sendo. Como exemplo, não é preciso ir muito ao passado: em meados dos anos 2000, escutamos na universidade que “a física não é lugar de mulher, pois não havia capacidade cognitiva delas para aprenderem cálculo”. Felizmente, o cenário está evoluindo – ainda que a passos lentos.  

A pesquisa de Cecília é tão significativa que, se ela fosse homem, teria sido reconhecida como um dos maiores cientistas de todos os tempos, e muitos provavelmente já conheceriam o seu trabalho acadêmico. Em vez de louros, a descoberta de Payne-Gaposchkin foi contestada pela comunidade dos astrônomos, que achavam que ela estava errada. Apesar de sua importância, a descoberta dela foi ofuscada pelo machismo que dominava a ciência na época. Ela foi discriminada por ser mulher e teve que lutar para ser reconhecida por seus méritos.  

Vamos a sua saga! Cecilia completou a “graduação” em Física e Química na década de 1920, na Universidade de Cambridge, que embora permitisse a participação de mulheres, ao final do curso, elas não eram tituladas. Ela se mudou para os EUA, em busca de melhores oportunidades e, em 1923, chegou ao Observatório de Harvard, que contava com uma prática “inclusiva”, empregando mulheres com contribuições significativas, mas sem o devido crédito. Cecilia chegou em 1925 com a resposta para a composição estelar: material estelar é constituído de Hélio e Hidrogênio. Apesar das críticas, incluindo a forte objeção de Henry Russel – um astrônomo proeminente na época e que a desencorajou de investigar a composição solar – contradizia a crença predominante de que as estrelas tinham a mesma composição que a Terra. A história tomou um novo rumo em 1929. Foi nesse ano que Russell creditou a Payne a descoberta de que o Sol possuía uma composição química diferente da Terra. Sua tese foi considerada por muitos a mais brilhante já produzida, no campo da astronomia.  

Apesar de visível genialidade, Cecilia continuou enfrentando obstáculos em Harvard. Entre 1927 e 1938, foi assistente técnica de Harlow Shapley, o diretor da época, mas não obteve um cargo oficial. A declaração de Abbott Lowell, presidente de Harvard, reforça a presença do machismo, ao jurar que ela nunca teria uma cátedra, enquanto ele estivesse vivo. Mesmo após a presidência de Abbott, o machismo persistiu, com Cecilia ocupando uma cadeira oficial, mas não de professora ou pesquisadora. Somente na década de 1950, ela assumiu a cadeira de professora e, posteriormente, chefe do departamento de astronomia de Harvard – a primeira mulher, obviamente.  Aposentou-se em 1966, embora ainda ganhasse menos que seus colegas homens, evidenciando a persistente disparidade salarial, baseada no gênero.  

A carreira de Cecilia serve como lembrete de que a ausência de mulheres na ciência ao longo da história não é reflexo de uma falta de habilidade ou entusiasmo, mas sim à misoginia histórica arraigada na sociedade. Apesar do seu trabalho brilhante e fundamental para a astronomia, foi o seu gênero que pesou mais, tendo que a levar à luta pelo devido reconhecimento. A história de Cecilia é uma fonte de inspiração para todas as mulheres que batalham por igualdade no campo da ciência.  

*Daniel Guimarães Tedesco é Doutor em Física pela UERJ e professor da Escola Superior de Educação, Humanidades e Línguas no Centro Universitário Internacional Uninter . 

*Graziele Aparecida Correa Ribeiro é Mestra em Ensino de Ciência e Tecnologia e professora da Escola Superior de Educação, Humanidades e Línguas no Centro Universitário Internacional Uninter. 

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Autor: *Daniel Guimarães Tedesco e Graziele Aparecida Correa Ribeiro


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