Qual o sentido da transformação digital para os pequenos negócios?

Autor: Jéssica Jorge Felipe de Souza - Estudante de Jornalismo

A transformação digital não é um processo novo e nem diz respeito apenas a dispositivos e serviços. É uma ferramenta social que está relacionada ao desenvolvimento humano. Não há uma pessoa no mundo que não tenha sido impactada pela transformação digital pelo menos uma vez na sua vida. Conhecido no meio corporativo e empresarial, o termo “transformação tecnológica e digital” tem a ver com a capacidade de desenvolver soluções e oferece às empresas a oportunidade de rever seus modelos de negócios.

Pensando nisso e considerando a importância das ferramentas tecnológicas no período de pandemia e a sobrevivência dos pequenos empreendedores, o Uninter Notícias conversou com a Vanessa Rolon, coordenadora dos cursos de graduação em Administração e Gestão Estratégica Empresarial da Uninter, para entender um pouco sobre como os pequenos negócios tem lidado com esse tipo de transformação e demanda social.

UN – A chamada Era Digital nasceu no final do século 20 e suas transformações sempre permearam o meio empresarial. Como entender os efeitos práticos da era tecnológica sentidos por organizações menores?

Vanessa Rolon – O grande empresário tem mais recursos financeiros, tem mais condições de investir no novo. Quando surge o CRM [Customer Relationship Management], por exemplo, que é um gerenciamento do relacionamento com o consumidor, ainda não existia a cultura, existia a ferramenta. Então, a ferramenta é uma coisa, uma tecnologia, você compra a ferramenta, você compra um software, mas quando não existe a cultura ela também não funciona sozinha. Então, não é só ser um grande empreendedor, ter recursos e achar que a tecnologia vai funcionar maravilhosamente. O pequeno empreendedor, nessa época do CRM, não tinha acesso à mesma ferramenta, mas tinha uma caderneta de mão e o controle, por exemplo, do que vendia por dia e do que o cliente mais procuraria em determinado período. Então, isso nos mostra que mesmo sem a tecnologia, já havia uma noção de velocidade e mudança no atendimento às demandas do cliente. É preciso pensar que os avanços tecnológicos são mais evidentes nas grandes metrópoles, mas que o pequeno empreender é muito adaptável.

UN – Existe o pensamento de que o sucesso e boa produtividade de um negócio estão atrelados ao desenvolvimento tecnológico?

Vanessa Rolon – Quando você investe em tecnologia, você tem a simplificação dos seus processos. A tecnologia propicia uma comunicação mais rápida entre as áreas, com dados mais assertivos e atualizados, permite resposta rápida ao consumidor. Então, essa automação dos processos e otimização dos recursos consequentemente traz uma redução de custo e o aumento da lucratividade. Boa produtividade é isso. Esse também deve ser o pensamento do pequeno empreendedor. Por exemplo, se eu decido fazer bolo em casa pra minha vizinhança e tenho só a ferramenta do WhatsApp, ela já serve pra eu, antes de divulgar o produto, pesquisar com minha possível clientela o que eles gostariam de consumir. Nessa situação, poderia ser o tamanho, o sabor do bolo… Por que produtividade está relacionada a atender a necessidade do seu consumidor, não adianta a produção sem a venda. Não adianta também você usar a tecnologia sem capacitação. Por exemplo, no caso do CRM, na época que ele surgiu, não funcionou muito bem por que não houve capacitação para os colaboradores que usariam a ferramenta com o consumidor final.

UN – Qual a importância da tecnologia para os pequenos negócios e como eles devem lidar com as complexidades desse meio?

Vanessa Rolon – O primeiro de tudo, mesmo com poucos recursos, é entender qual é o mercado dele, o que as pessoas querem. No marketing, a gente fala muito em “atender a dor do consumidor”, ou seja, manter um relacionamento com esse consumidor. É importante se reinventar dentro dessas complexidades. Hoje em dia, quando a gente fala “o consumidor tem acesso a tudo e a todos”, de fato ele tem. Ele tem muita informação. Então a tecnologia possibilita isso, a aproximação com o consumidor, por que quando não se tinha essa possibilidade você “perdia” o consumidor. A tecnologia propicia você inserir o consumidor como parte dos seus processos.

UN – Com o cenário da pandemia, sabemos que a necessidade de atendimento dos negócios pelos meios virtuais se tornou fundamental. No entanto, muitas empresas de pequeno porte encontraram dificuldades de que adequar a essa demanda. Na sua opinião, por que isso aconteceu?

Vanessa Rolon – As pequenas empresas são as que nasceram analógicas, outras já nasceram digitais. As empresas que nasceram analógicas precisam entender esse cenário e mudar o mindset de gestão dela, se inserindo nessa nova tecnologia e era digital administrando as informações em prol do seu negócio. Por exemplo, estar no Facebook, no Instagram, em grupos do WhatsApp já é uma prioridade para a comunicação com o cliente, diante dos novos tempos. É muita gente querendo fazer tudo ao mesmo tempo, então a dificuldade também está em administrar essa comunicação, esse conteúdo. A comunicação precisa estar integrada e com conteúdo relevante. Estar no meio virtual demanda preparo, é preciso pensar nisso. A pessoa precisa ter técnicas, ferramentas e se informar sobre o marketing digital. Não é só um investimento financeiro, mas também intelectual, no sentido da qualificação. O pequeno empreendedor pode até se adaptar mais rápido a essas mudanças, pode não ter tanto recurso financeiro, mas na área de gestão a forma de ele se adaptar é muito mais rápida por conta do processo produtivo ser mais curto. O grande empreendedor tem uma cadeia muito grande. Então, para introduzir alguma mudança, precisa conversar com todos os seus stakeholders, fornecedores, distribuidores. Então, até mudar aquela forma de gestão, é um pouco mais demorado.

UN – Por outro lado, segundo a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico, entre março e abril deste ano, o e-commerce cresceu 41%, devido à pandemia. Como o pequeno empreendedor pode se inserir nessa realidade de consumo?

Vanessa Rolon – Na verdade, é um desafio por que infelizmente muitos pequenos empreendedores ainda trabalham na informalidade. Mas os que permaneceram ativos até agora, que não fecharam as portas, já entenderam que o mercado do e-commerce está migrando de canal de distribuição para canais integrados, o que a gente chama de Omnicanal, que são vários canais integrados em uma rede. Compor essa rede não é só uma coisa do grande empreendedor, o pequeno também pode. As pessoas precisam mudar a forma de pensar, tendo em vista que certos formatos já não cabem mais. E mais, não adianta pensar que vai acabar a pandemia e as coisas vão voltar tudo como era antes. Não vai, essa mudança é o “novo normal”. Por exemplo, as empresas sempre falavam “trabalho remoto não dá certo. As pessoas não vão ser produtivas”, e agora o que percebemos? Que as pessoas estão, sim, entregando os resultados, trabalhando com eficiência, e que é possível. Então, quando a maioria das empresas retornarem, a expectativa é que de 80% a 90% dos colaboradores continuem trabalhando remotamente.

UN – A seu ver, as transformações aceleradas da Era Digital podem prejudicar o pequeno negócio?

Vanessa Rolon – Não, pelo contrário. Ela vem pra melhorar, vem pra reduzir custos, dar mais qualidade aos produtos, dar essa comunicação. Jamais ela vai prejudicar o pequeno negócio, desde que esse empreendedor esteja preparado pra acessar e usar essas novas tecnologias. Então, uma dica é trabalhar em rede, se unir a outros empreendedores, grupos e organizações. E também se informar e cobrar para que esse investimento venha da esfera pública, através das políticas públicas. Essas transformações fazem parte também de como enxergamos o todo e a sociedade precisa pensar nisso e mudar a maneira de se relacionar. Precisamos entender que não estamos dentro de uma bolha de vidro e que nada vai nos atingir. O que está “fora”, uma hora chega. Tudo que acontece na sociedade tem um reflexo sobre o indivíduo, seja na vida pessoal, no negócio dela. Então, para além no investimento em tecnologia, a gente precisa investir em cidadãos conscientes e transformadores. Me entender dentro da minha organização como parte de um todo mundo maior. A tecnologia não só pela tecnologia, mas a tecnologia fazendo a diferença dentro de uma sociedade.

UN – Vale a pena o pequeno negócio planejar e investir financeiramente nos meios digitais?

Vanessa Rolon – É preciso entrar nesse mercado, não tem como. Tem que investir. Mais com planejamento e metas proporcionais ao seu negócio. Hoje em dia, se você não está lá [na rede social, no mundo virtual] parece que você não existe. Então, é preciso investir, sim, mas com estratégias assertivas. Não é estar lá por estar lá. Planejamento é a palavra-chave.

Incorporar HTML não disponível.
Autor: Jéssica Jorge Felipe de Souza - Estudante de Jornalismo
Edição: Mauri König
Créditos do Fotógrafo: Andrea Piacquadio/Pexels


Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *