Os malefícios das notícias falsas para a ciência, inclusive na pandemia

Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo

Em meio a tantas dúvidas e incertezas, consequência de um período pandêmico que ninguém ainda havia vivido, um grande volume de informações contraditórias ou completamente falsas circula diariamente pelas redes sociais. Isso acontece por uma necessidade urgente da população, que exige respostas e soluções rápidas para o problema. Respostas essas que muitas vezes nem os especialistas possuem ainda.

Benisio Ferreira, coordenador do curso de Biomedicina da Uninter, explica que o conhecimento científico é uma construção, uma sucessão de tentativas com erros, acertos e ajustes. Graças a isso, por exemplo, testes que detectam contaminações podem ser realizados, pois são frutos de décadas de pesquisas e metodologias desenvolvidas. Para ele, o segredo para construir uma sociedade bem informada está na educação.

“Ainda existe uma deficiência na nossa educação, o que permite essa falta de capacidade de discernir o que é uma boa informação de uma má informação. Me incomoda muito que isso chegou até as esferas superiores. Independente do espectro político, todas as esferas superiores e governamentais estão colocando os pés pelas mãos e quem paga é a população”, afirma.

A professora Dinamara Machado, diretora da Escola Superior de Educação da Uninter, lembra que a sociedade tem o histórico de sempre buscar soluções “mágicas” e rápidas, mas que a ciência não é produzida em um “estalar de dedos”.

Segundo Benisio, o imediatismo e a falta de uma boa educação fazem com que as pessoas acreditem em qualquer receita milagrosa que recebem pelo WhatsApp, por exemplo. E também colabora para que governantes sugiram práticas absurdas sem nenhum tipo de controle sanitário. Ele observa que há falta de maturidade científica nos brasileiros. Além disso, a população tem o costume de achar que tudo o que é produzido fora do país é melhor do que o que acontece em solo nacional.

“Eu tive a oportunidade de estudar fora do Brasil e posso dizer que eles não são melhores que nós, de jeito nenhum. O cérebro brasileiro é muito valorizado lá fora. Nós não temos a mesma estrutura, os mesmos recursos de financiamento, mas é um problema para que a organização governamental dê conta daqui para frente”, relata.

O professor chama atenção para o fato de que a internet deu voz para todo mundo, e com isso acabam surgindo muitos “especialistas” que não entendem realmente sobre o que falam. Ele defende que o primeiro passo para sair dessa bolha de disseminação de informações deturpadas é focar em uma fonte de informação confiável. E, caso não saiba se pode ou não confiar, é importante conversar com profissionais da área e professores para evitar o excesso de sensacionalismo científico.

O assunto foi pauta da edição do Educa Brasil sobre o Imediatismo do brasileiro em tempos de pandemia.

A corrida por uma vacina

Desde o início da pandemia, vários países começaram as pesquisas e o desenvolvimento de uma vacina contra a Covid-19. Três projetos em especial ganharam destaque: Oxford, na Inglaterra, China e Rússia. No dia 11.ago.2020 o governo russo teria registrado a primeira vacina e a declarado pronta para uso. Apesar do presidente Vladimir Putin assegurar que ela passou por todos os testes necessários e ressaltar que uma de suas filhas teria já sido vacinada, cientistas do mundo todo, inclusive russos, desconfiam da veracidade das informações.

O professor Benisio afirma que é necessário ter informações sobre o processo de desenvolvimento da vacina para poder confiar no produto final, independente de qual país a esteja desenvolvendo. A Rússia não apresentou nenhum dado cronológico de desenvolvimento, da metodologia utilizada ou mesmo os resultados de testes realizados nas primeiras fases. Informações essas que foram disponibilizadas por Oxford e China, mas não pelo país russo.

“Tudo o que a gente aprende em imunologia, epidemiologia, patologia, biologia celular, me permite dizer, enquanto profissional de saúde, que essa vacina russa é uma piada de mau gosto. Se amanhã ou depois ela apresentar suas publicações, seus dados e todo mundo começar a discutir, fazer avaliação e realmente apresentar dados satisfatórios e que deem essa credibilidade ao produto final, ok. Mas até o momento, não”, conclui.

Ferreira garante que não está sendo pessimista e que a ciência russa merece atenção pela resistência e pelo respeitável desenvolvimento tecnológico, mas no caso da vacina, ela não existe cientificamente pela inexistência de informações. Apesar de algumas pessoas defenderem essa “confidencialidade” como uma preservação da parte industrial para a comercialização, o professor ressalta que isso poderia ser resolvido com o sistema de patentes internacionais.

Segundo o cientista, duas coisas são certas: com certeza haverá uma vacina e esse período difícil da pandemia deve acabar até o final de 2020. Para ele, em janeiro de 2021, os profissionais que estão na linha de frente no combate ao vírus, assim como pessoas do grupo de risco que não foram contaminadas neste ano, começam a ser vacinadas.

“Matematicamente, não há pessoas suficientes para manter os níveis altos de contaminação até novembro. Nós sabemos que a população não foi devidamente testada. Pelo fato dos números reais serem bem maiores, até setembro, outubro, inevitavelmente nós vamos começar a observar a diminuição do número de casos, do número de casos graves e do número de óbitos”, completa.

Movimento antivacina

No ano em que todos correm contra o tempo para o desenvolvimento de uma imunização contra o novo coronavírus, ironicamente ainda existem pessoas em oposição a vacinas. Isso tem causado sérios problemas, principalmente quando se fala no desenvolvimento de doenças que já haviam sido registradas como erradicadas há décadas. Ferreira atribui este fato também à falta de informação e boa educação nas escolas, desde os primeiros anos.

“O Brasil é o país número 1 em termos de programa de vacinação no mundo. Você não vai encontrar em nenhum outro país uma organização e uma eficiência em vacinar pessoas como a nossa. Vacina é uma coisa fantástica e a falta de educação cria pessoas contra vacinas”, afirma.

O cientista explica que a vacina não é um remédio, logo não traz cura. A imunização age como um efeito protetivo, o corpo recebe uma parte do patógeno ou o próprio patógeno atenuado, sem capacidade de deixar o indivíduo doente. Ao reconhecer, o organismo cria anticorpos, para que quando a pessoa entre em contato com o vírus tenha um “escudo” que não permite o desenvolvimento da doença.

Ferreira ainda chama atenção para o fato de que o Brasil precisa investir em saúde, ciência e desenvolvimento. Caso contrário, mais cedo ou mais tarde ocorrerá outra situação similar a essa pandemia, causando novamente um problema não só social, mas também econômico. O país perde excelentes profissionais para outros países por falta de investimento.

“Ficou mais que provado que educação, saúde e essa parte de ciência e desenvolvimento devem estar nos planos de defesa do país. Nós temos pessoas capacitadas, o que nós não temos ainda é uma organização para oferecer estrutura e financiamento para estas pessoas”, finaliza.

O bate-papo completo sobre essa temática continua disponível no canal do programa no Facebook.

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Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Danya Gutan/Pexels e reprodução Facebook


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