O papel do sistema universal de saúde diante das desigualdades sociais

Autor: Gustavo Henrique Leal - Estagiário de Jornalismo

A saúde tem um papel fundamental na busca pelo acesso aos direitos humanos e pela igualdade. O Brasil conta com maior sistema de saúde do mundo, o Sistema Único de Saúde, conhecido como SUS, que atende cerca de 190 milhões de pessoas por dia promovendo uma justiça social e também visando a desigualdade social presente. O papel universal da saúde no combate a desigualdades está ligado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, estabelecidos pela ONU (Organizações das Nações Unidas), que nesse caso se refere ao objetivo número 10, tratando da redução de desigualdades.

Para entender sobre como saúde e igualdade se ligam, basta entender o conceito de direitos humanos, normas que reconhecem e protegem a dignidade de todos os seres humanos. No entanto, nem todos têm acesso aos direitos básicos, como direito à vida, ao trabalho, à educação e outros. Essa ausência de direitos é um dos fatores responsáveis pela desigualdade social, que leva à criação de políticas de proteção social para amparar as pessoas que sofrem com isso.

“Precisamos avançar em estratégias primeiro de compreensão do que são direitos humanos e, claro, precisamos avançar em materializar esses direitos. Esse avanço se dá no meio de políticas públicas e elas precisam ser organizadas, daí o papel dos sistemas de proteção social que vão direcionar as políticas públicas para que atendam todas as necessidades humanas”, explica o coordenador dos estágios do bacharelado em Serviço Social da Uninter, Marcos Klazura.

O professor também destacou a ótica dos direitos humanos, que se baseiam em quatro formas: a desigualdade, que seria o acesso desigual a oportunidades; a igualdade, que são ferramentas e assistências distribuídas igualmente para o acesso as oportunidades; a equidade, ferramentas moldadas a partir da desigualdade de cada um; e a justiça, com o objetivo de consertar o sistema e oferecer ferramentas e oportunidades iguais para todos.

O sistema universal de saúde

A desigualdade é visível, e muitas vezes os sistemas de saúde são retratos disso. Muito antes na história, o homem não sabia o que era saúde, muito menos o que seria tratar uma doença. Ao fim da Idade Média, o Iluminismo joga à luz um período de trevas, que abre portas ao mundo da ciência e explica muitas situações, como a origem das doenças e seus fatores, porém o sistema não relata apenas desigualdade na saúde, ele consegue ir além e visibilizar outros problemas da falta de direitos humanos

“Os sistemas universais representam uma conquista civilizatória do século 20, ou seja, reconhecer que a saúde é um direito fundamental e estabelecer sistemas de saúde que possam considerar as desigualdades e considerar que a saúde é um direito e considerar que a saúde precisa de integralidade do cuidado. Isso iniciou em muitos países, começando pelo Reino Unido, mas a Europa toda implementou os sistemas universais. O Canadá, desde então, se comprovou que esse tipo de organização de política pública favorece você diminuir todas as desigualdades não apenas as desigualdades relacionadas a ter saúde ou não ter saúde”, explica a professora e doutora em Odontologia Ivana Busato.

O sistema implantado por esses países, que surge em movimentos revolucionários na busca de saúde, se baseia no ideal de welfare State (Estado de bem-estar social), que ganha força após a Segunda Guerra Mundial e consiste em um conjunto de politicas públicas, sob responsabilidade do Estado, para promover igualdade social e o bem-estar da população, expandindo a proteção social.

O Brasil

No Brasil, antes do SUS, o acesso à saúde funcionava a partir do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps) e somente 30% da população brasileira conseguia ter possibilidade de atendimento. O restante da população recorria às Santas Casas de Misericórdia que socorriam os enfermos e inválidos e que tinham um cunho religioso.

O governo adotou também uma estratégia de saúde para suprir as demandas de saúde das redes municipais, construindo e colocando na ativa os diversos postinhos de saúde, feitos para atender à população que morava em municípios distantes ou muito afastados de hospitais, fazendo com que chegassem também mais médicos e com um suporte maior a saúde, pois evitava que as pessoas fossem aos hospitais por atendimentos mais simples ou consultas rotineiras. Esses atendimentos, porém, não eram reconhecidos em termos de direitos humanos e políticos, mas apenas uma forma de melhorar a situação precária do país.

Um ponto que deve ser destacado é que o país brigava não apenas pela saúde, mas também pela democracia. “A gente não pode separar o direito à saúde do direito à vida, que tem como inspiração maior o valor da igualdade”, explica a doutora.

Logo ao fim da ditadura em 1985, a luta pelo direito à saúde foi reconhecida pelo movimento da Reforma Sanitária, que incluiu a sociedade, partidos políticos, trabalhadores, estudantes da área da saúde. Todos puderam ajudar a fazer uma reformulação no sistema de saúde, reconhecendo a saúde como direito e abordando o dever do Estado de propor um financiamento e melhorar as condições de vida.

Com a população podendo debater e discutir as questões sobre a saúde, todas as propostas sobre a melhoria das condições do sistema foram colocadas em votação, e as que foram aprovadas foram colocadas para discussão da Assembleia Nacional Constituinte e levadas para a Constituição Federal de 1988. O artigo 196 cita: “A saúde é direito de todos e dever do Estado garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação”.

“O artigo 196 aponta que nós implantamos o Sistema Único de Saúde com esse aspecto de ser universal e que também precisa fazer promoção, proteção, recuperação dos que sofrem influência de todas as desigualdades. Quando você fala de todas as questões sociais e econômicas da saúde do trabalhador e todas que podem de alguma maneira transmitir doença nas pessoas, aí nós temos que ver a questão do SUS que foi implantado na Constituição de 1988”, afirma Ivana.

O sistema universal tem um dever

Esses sistemas têm o papel de atingir todas as questões de desigualdades, questões sociais, raciais, de etnia, de condição econômica e demais que permeiam o tecido social. Um exemplo de como esses fatores estão interligados: se uma pessoa não tem uma boa alimentação porque trabalha demais, porque vive em um meio desigual, ela acaba se alimentando de outra forma e pode ter doenças relacionadas à alimentação, como diabetes ou hipertensão. O mesmo caso vai se aplicar a pessoas que não têm acesso ou não conseguem viver por causa das questões sociais explicadas.

“O setor da saúde tem responsabilidade de trabalhar de forma multissetorial, interdisciplinar e intersetorial para fazer com que essas desigualdades possam ser estabelecidas, exercendo a questão da defesa dos direitos humanos para que a gente possa efetivamente impactar na própria saúde dessas pessoas”, finaliza a professora.

O tema foi pautado pelo Global Meeting Uninter, com os professores Marcos Klazura, mestrando e coordenador dos estágios do do bacharelado em Serviço Social da Uninter, e Ivana Maria Saes Busato, doutora e coordenadora dos cursos de Gestão Hospitalar e Gestão em Saúde Pública. A transmissão ocorreu em 25 de outubro de 2022 e pode ser conferida neste link.

Incorporar HTML não disponível.
Autor: Gustavo Henrique Leal - Estagiário de Jornalismo
Edição: Arthur Salles - Assistente de Comunicação Acadêmica
Créditos do Fotógrafo: Reprodução YouTube


Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *