O impacto dos hábitos alimentares sobre as pandemias

Autor: Barbara Carvalho - Jornalista

Muitas são as especulações sobre como surgiu o novo coronavírus, responsável pela Covid-19, mas é quase unânime entre cientistas e pesquisadores que a infecção pode ter acontecido devido ao contato de animais portadores deste vírus com o homem. Tais tipos de infecções geralmente ocorrem devido às más instalações e locais insalubres, com baixa higiene e produção inadequada de carne para consumo humano. Sendo assim, o que tem a ver a produção inadequada de alimentos com o surgimento da pandemia?

O consumo consciente de alimentos é uma das lições que a pandemia tenta nos ensinar, mas que teimamos em não aprender. Este foi um dos temas debatidos durante a 2° Maratona de Saúde (30.abr.2021), realizada pelos cursos da Escola de Saúde da Uninter. A palestra contou com abertura da professora do curso de Gestão de Organizações do Terceiro Setor, Denise Erthal, e fala da doutora Fernanda de Almeida, pesquisadora em saúde pública da Fundação Oswaldo Cruz.

O primeiro ponto abordado por Fernanda tratou da questão da saúde ampla. Pode parecer óbvio dizer que uma pessoa não está doente devido à ausência de doença no corpo, mas a pandemia mostrou que a definição de saúde precisa ser repensada, tratando não só da física, mas também da emocional e da mental. “É algo que parte da questão do bem-estar, uma pessoa que está desempregada, com contas para pagar mas não tem salário, não sabe o que vai comer, e que vive em um ambiente de vulnerabilidade, não está em boas condições. Assim, o indivíduo pode estar sem doença, mas ela está longe de ser uma pessoa saudável”.

No decorrer da conversa, Fernanda aprofundou o assunto quanto ao agronegócio, citou as práticas de agricultura que incorporam questões sociais, políticas, culturais, ambientais, energéticas e éticas, pois, de acordo com ela, elas possuem uma ligação direta com o surgimento da pandemia. Segundo a pesquisadora, esses sistemas de produção de proteína fora da realidade social ultrapassam o adequado quanto a nível sanitário, colocando em pequenos espaços animais sem nenhuma higiene ou fiscalização.

“Se a gente não discute isso, se não debatemos agora as nossas condições de produção alimentar, essa pandemia não vai ser a última, e as próximas serão cada vez mais frequentes, porque nós não conseguimos mais enquanto planeta, enquanto condições ambientais, enquanto recursos disponíveis, sustentar sistemas agroalimentares da forma que eles são conduzidos hegemonicamente no planeta”, questiona Fernanda.

O Sars-Cov2 não é a primeira doença de origem zoonóstica. Estas doenças representam 70% das enfermidades surgidas desde os anos 1940 e 75% das doenças infecciosas emergentes. Acontece que essas doenças “pulam” do organismo animal e encontram “abrigo” no corpo humano sem anticorpos para se defender delas. As gripes aviarias e suínas, além de outras doenças como Ebola e o Mers (Síndrome Respiratória do Oriente Médio) são exemplos de como o contato da exploração de animais pelos humanos colaboram para o surgimento de doenças que se espalham a longa escala e dão surgimento a endemias e pandemias.

Fernanda aponta que os sistemas agroalimentares são um sinal para a perspectiva do consumo. Comer é um ato político e é necessário ter a consciência de onde vem o com o que estamos nos alimentandos. Ela alerta para a questão da produção de alimentos produzidos mundialmente e a fome. Segundo ela, atualmente é produzido em nível mundial alimentos da ordem de três vezes a população mundial, ressaltando que o problema não é a comida, mas sim o seu acesso, além da maneira de produção que privilegia grandes empresas e não os pequenos produtores.

“Qual é a mensagem que eu passo quando no meu prato todos os alimentos vêm de grandes cadeias de mercado, são produzidos por empresas, são alimentos ultraprocessados? Assim, estou dizendo que não quero políticas públicas que estejam voltadas a agricultura familiar, que não me importam políticas públicas que colaboram com o giro de dinheiro local, dentre outras questões”.

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Autor: Barbara Carvalho - Jornalista
Edição: Mauri König
Créditos do Fotógrafo: Abattoir de Houdan/Wikimedia Commons


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