Máscaras na pandemia impõem barreiras aos surdos, mas Mariana ensina a superá-las

Autor: Igor Ceccatto - Estagiário de Jornalismo

O último 5 de maio foi um dia especial para Mariana Victoria Todeschini. Professora de Libras no curso de pós-graduação em Educação Especial e Inclusiva da Uninter, ela possui surdez profunda e foi convidada pelo Centro de Informação de Medicamentos da Universidade Federal do Vale de São Francisco (CIM\UNIVASF) para participar de uma live.

O tema foi “O surdo e a pandemia – o olhar de uma farmacêutica surda”. O evento marcou também o Dia Nacional do Uso Racional de Remédios, que é uma campanha de alerta sobre os riscos da automedicação. Desde 2017, o CIM traz orientações e informações sobre remédios para a comunidade surda e deficientes visuais.

Esse convite se deu porque Mariana é formada em Farmácia. Durante a live, ela falou da importância do uso racional de medicamentos e de como sua atuação profissional mudou na pandemia, sendo ela uma pessoa surda. “Na pandemia, pelo medo de ir a um hospital e ter que ficar em casa, a automedicação aumenta, e aí está a importância do meu trabalho e do CIM”.

Mariana trabalha em uma farmácia, a Farmaglobo, em Campo Largo (PR), e diz que a máscara passou a ser uma nova barreira para os surdos. “Tudo fica diferente, pelo fato de ter que usar máscara e não poder ler os lábios do cliente para entender o que ele quer. Assim, pego a receita, leio no lugar reservado e depois volto para falar com ele e passar as orientações. Nós surdos acabamos sofrendo muito com isso, mas não podemos deixar de procurar informações para ajudar as outras pessoas. Eu, por exemplo, participo de um grupo no Facebook sobre a pandemia só para surdos, e me mantenho informada sobre tudo”, relata.

Sua vivência na área farmacêutica a levou a idealizar o projeto Farmalibras, junto com a UNIVASF e o Conselho Federal de Farmácia (CFF). “Buscamos convencionar sinais específicos da farmácia em libras, assim outros surdos não precisarão passar pelas dificuldades que passei no curso”, explica. Em entrevista à Central de Notícias Uninter (CNU), Mariana falou sobre sua trajetória.

CNU – Conte-nos um pouco sobre como sua história começou e quais desafios enfrentou nesse caminho.

Mariana Todeschini – Antes de eu me formar em Farmácia, foi necessário passar por muitos desafios. Da 1ª. série até o Fundamental II, possuía todo o auxílio necessário na escola especial para surdos. Todos os alunos eram surdos e os professores ouvintes (não surdos) sabiam Libras. Mas foi no Ensino Médio que as dificuldades começaram, quando tive que estudar em uma escola convencional. Como a Língua Portuguesa é muito diferente da Libras, tinha muita dificuldade e acabava tirando notas vermelhas e tendo que refazer provas, então a alternativa era gravar as aulas e meus pais transcreverem todo o conteúdo para eu estudar. Apesar disso, não acho que isso foi de todo ruim, pois apesar das dificuldades, isso me ajudou a entender melhor a língua portuguesa, aprendendo a escrever corretamente.

CNU – E para entrar na faculdade, as dificuldades continuaram? Como se deu esse processo?

Mariana – Com o ensino médio chegando ao fim, no final de 2009, chegou a época de prestar vestibular. Eu tinha o sonho de estudar Farmácia, mas a rejeição atrapalhou. Prestei 8 vestibulares em faculdades diferentes, era aprovada, mas não me aceitavam pelo fato de não contratarem intérpretes para os surdos. Mas no meio disso tudo duas universidades acenderam a esperança em 2010: a UNICSUL, em que passei para Farmácia, e a UNISANTANA, onde passei em biologia, aceitaram minha matrícula. Optei por Farmácia e me matriculei na UNICSUL, em São Paulo. Isso só foi possível pelo fato de minha mãe ter me levado para conversar com o coordenador do curso e mostrado que eu era capaz, pois ainda existem muitos preconceitos com a pessoa surda.

CNU – Então você foi aprovada no curso que desejava e se matriculou, mas e para se formar, como foi o processo?

Mariana – Na faculdade não foi diferente. Como não possuía um intérprete específico formado na área, tinha que gravar as aulas como no ensino médio e meus pais transcreverem, pois mesmo com a leitura de lábios do professor, não entendia 100 %. Mas faltando 1 ano para concluir o curso, conheci uma mulher intérprete de libras, que frequentava a mesma igreja que eu e era formada em Biomedicina e não demorou muito para que ela começasse a me ajudar. Logo também avisei o coordenador para que a contratasse para interpretar as palestras da universidade, o que ajudou muito na compreensão e dali para frente só foi melhorando.

CNU – O que você diria para motivar outras pessoas surdas?

Mariana – Eu acho que as pessoas surdas não devem pensar que não são capazes apenas por sua deficiência, e se têm um grande desejo não devem desistir. Mas algo que também é muito importante nisso tudo é o apoio de família, a força que meus pais sempre me deram e apoio foi essencial. É como minha mãe sempre dizia, por ser apegada a Deus, assim como eu: “Tudo posso naquele que me fortalece”.

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Autor: Igor Ceccatto - Estagiário de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Arquivo pessoal Mariana Victoria Todeschini


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