Clímax administrativo

Autor: Roberto Pansonato*

Não é segredo para nenhum brasileiro, nem para outros povos que acompanham e conhecem a nossa realidade, que o Brasil é um país que não contribui para que os empreendedores, principalmente os pequenos e médios, tenham sucesso na abertura de uma empresa. Segundo o relatório Doing Business, do Banco Mundial, a sobrecarga regulatória desvia a energia dos empresários brasileiros e tende a empurrá-los para a informalidade.

O tempo que se leva para abrir uma empresa no Brasil é um dos maiores do mundo. Entre 190 economias avaliadas pelo Doing Business, o Brasil ocupa o lugar de número 124. De acordo com a revista Isto é Dinheiro (n.º 1227, de 18/06/2021), embora esse número seja contestado pela Receita Federal (o número correto “seria” 94), ainda, ficaríamos atrás de El Salvador, San Marino e Santa Lucia, e pouco à frente do Nepal e das Filipinas. Tempos para obtenção de alvarás de construção e de funcionamento aqui no Brasil são longos, o que inviabiliza novos negócios.

Bom, mas por que esses inconvenientes acontecem no Brasil? Se essa pergunta fosse direcionada ao grande público, provavelmente uma das justificativas mais respondidas seria a burocracia. Mas será que a burocracia é necessária? De certa forma sim, pois a burocracia tem como um dos seus objetivos fazer com que as empresas possam ser administradas de formas eficiente e eficaz por meio de regras, normas, regulamentos, procedimentos, padrões e outros aspectos fundamentais para operação de uma organização.

É concebido a Max Weber, sociólogo alemão, economista, político e estudioso da administração, o conceito da burocracia e sua relação com as instituições. Vale ressaltar que a época em que Max Weber viveu e criou os fundamentos da burocracia refere-se ao período da Revolução Industrial, no final do século XIX, portanto muita coisa mudou até os dias de hoje.

Assim, sabe-se que a burocracia é necessária para se administrar organizações, no entanto, quando as atividades burocráticas interferem e se sobrepõem à agregação de valor que se espera de um processo, principalmente processos de serviços, há algo de muito errado. Estima-se que boa parte dos processos administrativos não agrega valor ao cliente e tampouco à organização que os produz.

Funcionários realizam atividades que, na sua grande maioria, não agregam em nada ao cliente ou consumidor final, constituindo os desperdícios de tempo, mão de obra, qualidade, criatividade, entre outros. Embora o excesso de burocracia reine nos serviços públicos, isso também ocorre em empresas privadas, a ponto de alguns poucos, mas nocivos, gestores e funcionários em geral, orgulharem-se da complexidade criada em torno dos processos administrativos, tal qual um clímax administrativo, que satisfaz apenas seu criador.

E vejam que essa história maligna, não começou hoje. Tivemos no Brasil, no ano de 1979, até 1986, um ministério exclusivo para a desburocratização, comandado, inicialmente pelo ministro Hélio Beltrão, que tinha como um dos seus objetivos, pasmem, reduzir o impacto da burocracia na economia e na vida dos brasileiros. Depois dessa iniciativa, vários outros projetos foram orquestrados em diferentes governos, no entanto, para a população que necessita de serviços de qualidade, ainda há muito o que fazer.

Mas o que o cliente, o consumidor, ou o contribuinte quer, afinal? Resposta básica: ser bem atendido e perceber que, ao final, houve agregação de valor, que nada mais é do que a relação entre a percepção sobre um produto ou serviço consumido, e a expectativa inicial gerada. Se a percepção pelo menos coincidir com a expectativa, temos aí um cliente, ou um consumidor, ou um contribuinte satisfeito.

A digitalização dos processos não é garantia de processos eficazes e, muitas vezes, é possível encontrar processos totalmente digitalizados e em contrapartida com um nível de agregação de valor sofrível.

Para atender o objetivo de diminuir o impacto da estrutura burocrática na economia e vida social brasileiras, temos que combater esse orgasmo administrativo. Há de se chegar ao prazer por outros meios, que não sejam pelos processos administrativos.

Necessitamos urgente de um choque de administração eficaz em nossos processos.

* Roberto Pansonato é designer de produto, com atuação em Gestão de Engenharia de Processos e Produção. É professor da Uninter, onde atua na tutoria dos cursos de Logística e Gestão do E-Commerce e Sistemas Logísticos.

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Autor: Roberto Pansonato*
Créditos do Fotógrafo: Domenico Mattei/Pixabay


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