As origens do tráfico de escravos negros, a maior migração forçada da história

Autor: Leonardo Tulio Rodrigues – Estagiário de Jornalismo

Desde o início da colonização europeia nas Américas, a força de trabalho dos escravizados foi o principal motor para o desenvolvimento econômico do continente. Mas, apesar desse ser um tema conhecido pela maioria dos brasileiros, ainda são poucas as pessoas que conhecem detalhes importante dessa história.

Doutor em História pela Emory University, de Atlanta (EUA), Leonardo Marques aborda a questão da diáspora africana na obra “O outro lado da moeda: estimativas e impactos do ouro do Brasil no tráfico transatlântico de escravos”, produzida em parceria com Gustavo Acioli Lopes, doutor em história econômica pela Universidade de São Paulo (USP). “Foi a maior migração forçada da história”, explica, falando sobre os mais de 5 milhões de pessoas que foram arrancadas do continente africano.

De acordo com Marques, o principal motivo que levou europeus a permanecerem no território americano foi a exploração de minérios como o ouro e a prata, no período inicial de colonização, conhecido como Expansão Ibérica (1492-1648). No início, a mão de obra indígena era bastante utilizada na mineração. “O trabalho era coercitivo e muitos morriam por doenças trazidas da Europa”, afirma.

Marques usa como base de seu raciocínio a obra The Native Population of the Américas in 1492, de William Denevan, lançada em 1992. Nela, o autor relata que cerca de 54 milhões de indígenas viviam em todo o território do continente americano quando os europeus desembarcaram, no século 15. Segundo dados divulgados pelo IBGE no Censo de 2010, o número atual de indígenas em território brasileiro não chega a 900 mil indivíduos.

A exploração portuguesa do Brasil teve início em 1530, com a colonização no Nordeste, tendo alcançado seu auge entre os anos de 1700 e 1800, com a exploração de ouro na região que hoje é conhecida como o estado de Minas Gerais. Nesse período, a mão de obra escrava africana já era majoritária e indígenas não tinham mais papel relevante nesse processo.

O Brasil é o país que mais traficou escravos entre os séculos 15 e 16, passando dos 5 milhões de pessoas. Também pode-se destacar a Grã-Bretanha, responsável por traficar 3,2 milhões de africanos, e a colônia espanhola no Uruguai, com cerca de 1 milhão de indivíduos escravizados. Grande parcela dos africanos que eram capturados morria durante a travessia, dadas as condições insalubres dos navios.

A alta demanda de escravos

Abordando não só a colonização do Brasil, mas também do Caribe e da América do Norte, Marques explica que as plantações de açúcar, chá, café e tabaco, consumidos em grande volume na Europa, foram responsáveis pela alta demanda de escravos nos séculos 18 e 19.

Nesse ponto, a história da Inglaterra está diretamente ligada com a escravidão em países como a Jamaica, São Domingos (agora Haiti) e o próprio Brasil. “Para você ter esse açúcar barato, você precisa ter trabalho escravo do outro lado do Atlântico”. Para o pesquisador, não podemos desvencilhar a história do capitalismo financeiro na Europa da expansão da escravidão no Brasil.

Entre os anos de 1815 e 1867, o café era o motor da economia brasileira. Plantado no Vale do Paraíba, em SP e RJ, ele levou o Brasil ao status de maior produtor do mundo no século 19. Além do café, outros produtos se destacavam na América, como o açúcar produzido em Cuba e o algodão nos EUA.

Mas, afinal, por que africanos?

A escravidão é um sistema milenar praticado desde o mundo antigo por diversos povos, como os romanos, gregos e egípcios. Em seus estudos, Marques também procurou entender por que o africano passou a ser visto como o “escravo por natureza”.

Durante a Idade Média, havia uma alta demanda por trabalho escravo no que estudiosos chamam de mundo mulçumano, território que hoje vai da Europa Oriental ao Oriente Médio. Nessa época, europeus eram escravizados por outros europeus para serem colocados em funções militares, administrativas e de produção.

Marques conta que após o ano 1.000 D.C., com a expansão do cristianismo, a escravização de europeus por europeus, ou mais precisamente de cristãos por cristãos, passa a ser um tabu no Ocidente. A África Subsaariana passa então a ser o principal “fornecedor” de escravos para esses países.

“A ‘legitimidade’ da escravidão da população africana também foi feita com base na Maldição de Cam”, afirma. No conto bíblico, Noé amaldiçoa seu filho Cam por ter visto a nudez de seu pai. As razões pela qual o personagem amaldiçoou seu filho não são claras até os dias de hoje, mas muitos afirmam que essa história serviu para fundamentar a dominação dos israelitas sobre o povo cananeu. Séculos mais tarde, a história foi usada por correntes religiosas para justificar a escravidão baseada na cor da pele.

Leonardo Marques foi o palestrante convidado no 1° dia do 3º Encontro Linguagens e Sociedade da Uninter, no dia 23 de novembro de 2021. Com o tema “A vida em movimento: migrações e diásporas”, o evento também contou com a presença da diretora da Escola Superior de Educação, Dinamara Machado, da doutora em estudos literários Deisily de Quadros, do especialista em metodologia do ensino de história Gladisson Silva, e do doutor em história social André Cavazani.

Você pode assistir à transmissão completa pelo canal de YouTube da Escola Superior de Educação, clicando aqui.

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Autor: Leonardo Tulio Rodrigues – Estagiário de Jornalismo
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro
Créditos do Fotógrafo: Tela de Johann Moritz Rugendas (1830)


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