A saga de Helen em 240 horas pelo Amazonas a caminho da sala de aula

Autor: Texto: Juliane Lima - estagiária de jornalismo; Arte: Julia Siqueira; Foto: Mauri König

Durante dois anos, Helen se viu privada do convívio diário com a filha de 11 anos. Passava os dias no distrito de Caldeirão, isolado nos recônditos da Ilha de Marajó, no Pará. Para chegar ali, viajava em barcos singrando as águas do Rio Amazonas, se embrenhando por igarapés quase intransponíveis. A escola em que Helen Barbosa da Cruz, de 35 anos, dava aulas a crianças do ensino infantil e fundamental também era a sua morada.

O distrito de Caldeirão é composto por pequenas vilas distantes umas das outras, com apenas 5 ou 6 famílias por localidade. Helen se mudou para lá em 2014, por força das contingências. Era o “pedágio” para realizar o sonho de infância: ser professora. A prefeitura de Afuá, onde ela morava, também na Ilha de Marajó, contratava apenas professores concursados com formação superior para ocupar as vagas nas escolas da cidade.

Essas restrições já haviam levado Helen a ingressar pouco antes em uma graduação em Pedagogia. Como atuava por contrato temporário em Afuá, teve de se mudar para Caldeirão. Não havia alternativa, se quisesse persistir no sonho do magistério. E então passou a lecionar na escola municipal para crianças do ensino infantil ao 5º ano do ensino fundamental.

Os percalços vinham de antes. Quando concluiu o ensino médio, já tinha o desejo de iniciar o curso de Pedagogia, mas as escolas da sua cidade não emitiam o histórico escolar. Então, precisou ir à vizinha cidade de Breves, ainda na Ilha de Marajó, para pegar o documento. Só então pôde começar a faculdade, matriculando-se no curso de Pedagogia no polo de educação a distância da Uninter em Macapá, capital do Amapá.

Helen agora tinha de revezar os estudos com o trabalho no Caldeirão, que fica a 8 horas de barco de Afuá, então não havia outro jeito senão morar na própria escola. Como o distrito não dispõe de serviços públicos, como bancos, por exemplo, os funcionários públicos têm 3 dias livres por mês para ir a Macapá resolver questões financeiras e comprar suprimentos para o restante do mês. Era também o momento de Helen rever a filha e o marido, que permaneciam em Afuá.

De catraia no Amazonas

O meio de locomoção era o catraio, ou catraia. Nesta embarcação típica da região, Helen levava 10 horas para chegar no polo de Macapá, onde realizava as provas no polo de educação a distância da Uninter. Em seguida, retomava a viagem de barco por mais 6 horas até chegar em Afuá para rever a filha e o marido. Durante 2 anos, foram 240 horas de viagem para ir e vir do polo de Macapá. A vontade de concluir sua graduação era maior do que todas essas adversidades.

No final de 2015, Helen conseguiu retornar às cidade onde morava desde os 9 anos, quando o pai passou a trabalhar em uma exportadora de madeira na região. Tinha sido convidada pelo Padre Manoel Nunes para dar aulas no projeto de reforço escolar no projeto Anjo da Guarda, mantido desde 2012 pela Renovação Carismática Católica do Brasil em Afuá. Ainda assim, havia os deslocamentos mensais para ir a Macapá fazer as provas.

Tinha aplacado as saudades da filha, a futura pedagoga ainda precisava ir a Macapá todos os meses para fazer as provas e receber orientações dos tutores. Nesse trajeto, tinha a companhia de outros 10 colegas da Uninter. Na cidade existem opções de lanchas que fazem o percurso em apenas 2 horas, ao custo de R$ 70,00 por pessoa. A opção mais barata, R$ 40,00 por passageiro, é a que cabe no bolso dos estudantes, e o tempo de viagem chega a 6 horas.

Helen estava prestes a se formar quando a Uninter abriu uma unidade em Afuá, em 2018, o primeiro polo de educação a distância do município. O tempo de deslocamento de casa até o polo não levava mais do que 7 minutos de bicicleta. Helen enfim se formou em Pedagogia na Uninter, em 2018.

Todas essas dificuldades pelas quais passou deixavam Helen preocupada quanto ao futuro da filha, prestes a concluir o ensino médio. A jovem planeja estudar engenharia, mas a mãe conhecia muito bem o sacrifício que era fazer uma graduação morando em Afuá, e o custo de manter a filha fora da cidade não caberia no orçamento de Helen. “Com a Uninter hoje em Afuá, sei que vai ser uma garantia para ela de um futuro, que ela vai poder dar continuidade nos estudos dela sem precisar sair de casa”, diz.

O impacto da educação

Relembrando todos os percalços por que passou para concluir sua graduação, destaca como a educação a distância foi essencial para otimizar o seu tempo e não deixá-la desistir do sonho do diploma. “Hoje a Uninter facilita muito a vida do aluno, porque o próprio aluno faz o seu tempo. É diferente do ensino presencial, ou até de uma outra instituição que estipula tal hora com videoconferência, você tal hora tem de estar ali na frente do computador ou da televisão para assistir. A Uninter não, ela te dá essa liberdade de você escolher o seu horário para fazer o seu estudo”, afirma.

Helen avalia o impacto de sua graduação para melhorar a educação no seu município. “A partir daquele momento, eu poderia contribuir ainda mais com a educação, com as crianças, dentro do meu trabalho, e trazer experiências novas, novos métodos de trabalhar. A pedagogia clareou o meu método de trabalhar, de ver a educação, de mudar”, complementa a pedagoga.

A principal mudança que ela notou enquanto foi aperfeiçoando seus métodos de ensino foi o próprio interesse das crianças nas atividades que ela trazia, a cada novo aprendizado na faculdade. “A maneira de trabalhar através dos jogos, do lúdico, a mudança do tradicional, é algo que chama muito a atenção das crianças. Elas aprendem brincando”, diz a professora, que hoje percebe o prazer em aprender nos seus alunos.

O caso de Helen comprova o papel da educação a distância para fazer com que a formação de qualidade chegue aos brasileiros que estão longe dos grandes centros urbanos. Em Afuá, o polo é logo ali, basta subir na bike – e agora sobra mais tempo pra estudar.

 

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Autor: Texto: Juliane Lima - estagiária de jornalismo; Arte: Julia Siqueira; Foto: Mauri König
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro


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