A pandemia e o agravamento da fome no Brasil

Autor: Barbara Carvalho – Jornalista

Dentre diversos assuntos que ganharam maior visibilidade devido à pandemia, o problema da fome se destaca. Infelizmente, a pandemia aumentou muito o número de pessoas que não têm o que comer no Brasil.

O desemprego ocasionado em decorrência da Covid-19 deixou milhares de pessoas sem renda para a compra de alimentos, aumentou o número de pessoas em nível de pobreza e colocou o Brasil novamente no Mapa da Fome. Na mídia, o aumento no preço de diversos alimentos virou notícia corriqueira, e vimos muitas manchetes salientando como o brasileiro estava sendo levado a alterar seus hábitos de consumo por causa da queda no poder aquisitivo. Mudanças nos hábitos alimentares ficaram evidentes, como a opção pelo consumo de ovos em lugar da carne, que atingiu preços proibitivos.

 

Josué de Castro e a Geografia da Fome

Josué de Castro é um nome muito conhecido entre os nutricionistas brasileiros. Médico, nutrólogo e geógrafo, foi um importante ativista no combate à fome no Brasil. Uma de suas mais importantes atuações foi como embaixador brasileiro junto à Organização das Nações Unidas (ONU). Dentre as diversas obras que escreveu, Geografia da Fome é provavelmente a mais lembrada, lançada em 1946.

O livro é fruto de uma experiência particular do autor que, percorrendo todo o país, fez um levantamento do que as pessoas comiam e de quais eram suas deficiências nutricionais. Assim, a obra expõe o quadro trágico da fome no Brasil na primeira metade do século XX, enfatizando as origens socioeconômicas do problema além de denunciar ações que normatizavam aquela condição.

Uma das coisas que Castro descobriu, e divulgou no livro, é a condição da fome oculta, em que uma pessoa aparenta estar saudável, mas possui diversas deficiências de micronutrientes. A partir de sua pesquisa, passou-se a se ter um novo olhar sobre a fome no Brasil.

 

(In)Segurança Alimentar e o Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA)

Para falar sobre a situação atual da fome no país, é preciso levar em conta dois conceitos básicos relacionados ao direito e dignidade do ser humano.

O primeiro é o de “segurança alimentar”, conceito que visa garantir a todas as pessoas o acesso regular e permanente a alimentos de qualidade e em quantidade suficiente, de forma que a alimentação não comprometa o seu acesso a outras necessidades. Atualmente, devido à crise financeira causada pelo coronavírus, boa parte da população precisou readaptar seus hábitos de consumo, optando por alimentos mais baratos. Esse tipo de situação configura um quadro de insegurança alimentar.

“Isso mostra como nós estamos vivendo em um mundo instável e dados mostram que o brasileiro está vivendo em uma insegurança alimentar constante devido a diversos fatores. Se você trocou um hábito e parou de consumir um alimento que consumia constantemente, já está em um quadro de insegurança alimentar”, explica Alisson David da Silva, professor do curso de Nutrição da Uninter.

Já o “direito humano à alimentação adequada” (DHAA) se enquadra no artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, e trata da necessidade de garantir que todas as pessoas tenham os recursos necessários para sua sobrevivência, como emprego ou terra. Dessa forma, o DHAA engloba também aspectos sanitários e da cultura alimentar da população.

 

Panorama da fome

O professor Alisson destaca que, em 2014, o Brasil conseguiu o feito de sair do Mapa da Fome. De acordo com números de pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), baseados de 2001 a 2017, em 15 anos houve uma redução de 15% no contingente de pessoas na pobreza, e de 25% da extrema pobreza. Mas atualmente os números não são tão otimistas.

De acordo com inquérito nacional da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar, em 2020 o número de pessoas que estavam em situação de insegurança alimentar leve e grave aumentou muito, chegando a 34,7% e 9%, respectivamente, números preocupantes se comparados com os dados de 2013, quando a insegurança alimentar leve e grave atingiam 12,6% e 4,2% da população brasileira, respectivamente.

Também podemos observar estas diferenças por macrorregião. Observa-se que, na época em que o Brasil conseguiu sair do Mapa da Fome, todas as regiões encontravam-se com no máximo 10% da população em situação de fome. Hoje, regiões como Norte e Nordeste voltaram a patamares alarmantes, com níveis de fome acima dos 14%.

 

Desperdício de alimentos

Além do problema da fome, sofremos com o desperdício de alimentos. Um dos lugares mais conhecidos quando se trata deste tema são as Centrais Estaduais de Abastecimento (Ceasas). Por motivos econômicos, alimentos que não são vendidos acabam simplesmente sendo descartados, explica Alisson.

No ramo agrícola a questão financeira também interfere, pois quando o produto está muito barato, não compensa para o agricultar levá-lo até a venda, e dessa forma este alimento acaba sendo descartado. Também temos o desperdício nas estradas, que acontece quando o alimento vaza dos caminhões e outros meios de transporte, além de restaurantes e supermercados, onde também se desperdiça muito.

Porém, o local de maior desperdício são os lares. Dados levantados em 2021 apontam que, até o momento, 931 milhões de toneladas de alimentos foram descartados no país, sendo que 61% deste desperdício está nas residências, 26% nos serviços de alimentação e 13% no varejo. Estes são números para refletir em como lidamos com o alimento dentro de nossas próprias casas.

Mas o que podemos fazer para evitar todo este desperdício? Práticas simples podem ser inseridas no dia a dia para garantir que o desperdício de alimentos seja diminuído, tais como: ir ao supermercado com lista de compras; evitar fazer grandes estoques de alimentos; reaproveitar sobras e congelar alimentos;  não julgar pela aparência, entre outros hábitos.

Panorama da fome e desperdício de alimentos foi o tema da live que aconteceu durante a II Maratona da Sustentabilidade Uninter, no dia 11 de junho. Para conferir essa e outras conversas com temas relevantes, basta acessar o link.

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Autor: Barbara Carvalho – Jornalista
Edição: Mauri König
Revisão Textual: Jeferson Ferro


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