Concurso Cultural - Egresso

Quando conselho de mãe rende uma profissão e muitos prêmios

Autor: Thayse Smek Uberna – Pedagogia (Curitiba-PR)

Ana Ilária, minha mãe, vem de numa família descendente de ucranianos católicos, vindos ao Brasil no período da guerra. Instalados no município paranaense de Paula Freitas, quase na divisa com Santa Catarina, ela vivia no campo com alguns de seus irmãos. Ao todo seus pais haviam tido 12 filhos, mas três faleceram ainda pequenos, alguns se casaram e saíram de casa, outros se casaram e permaneceram na casa da família.

Ana, a caçula, tinha como responsabilidade cuidar de casa e dos sobrinhos. E ai dela se não fizesse tudo direitinho. Insatisfeita, alimentava o sonho de se mudar do interior para a capital.

Mas suas opções para o futuro eram restritas: podia ir trabalhar em casa de família (o que não mudava muito sua situação); fazer magistério e se tornar professora alfabetizadora (o que não queria); ou então arrumar marido. Ela não queria se casar com os filhos dos vizinhos, pois continuaria no ciclo de submissão familiar.

Um dia, em visita à cidade de União da Vitória (PR), conheceu Estefano, um aposentado ferroviário. Trocaram cartas, namoraram e, seis meses depois, estavam casados. Como ele morava em Curitiba, ela foi se tornar dona de casa na capital, e assim ficava longe da opressão familiar do sítio.

Ana e Estefano tiveram quatro filhos. Primeiro veio um homem, depois meninas gêmeas (eu sou uma delas), e então mais um menino.

Quando eu e minha irmã terminamos o Ensino Fundamental, a mãe nos sugeriu que fizéssemos magistério. Apenas eu aceitei a ideia, e me matriculei no curso de Formação de Docentes da Educação Infantil e das Primeiras Séries Iniciais do Ensino Fundamental.

Na turma havia quarenta meninas e dois meninos. Quando completávamos dezesseis anos, começávamos a fazer estágio na Educação Infantil ou nos primeiros anos do Ensino Fundamental. Foi então que pedi a meu pai: — Todas as meninas trabalham, posso trabalhar também? Ele respondeu: — Se você quer, pode sim.

No final do terceiro ano do curso, o pai faleceu. O peso da vida e a tristeza tomaram conta dos nossos corações. O último ano do curso havia começado e surgiu a oportunidade de fazer um concurso público, garantia de um trabalho digno. Em 2012, então, fiz dois concursos e passei em um deles, assumindo o cargo de Professora da Educação Infantil na cidade de Curitiba (PR).

No ensino superior, decidi cursar Licenciatura em Artes Visuais, pelo apreço que tive pelos meus professores de artes na escola. Mas esta escolha não era bem vista no meu trabalho. Havia cobrança da pedagoga da escola, da diretora e das famílias, que eram muito presentes, para que eu buscasse a formação em Pedagogia. Eu era alvo de críticas das minhas colegas, que não viam meu trabalho com bons olhos: “Mas ela só faz sujeira. As crianças estão sempre falando e agitadas. O que ela inventou dessa vez?”

Essas críticas aconteciam porque as crianças brincavam com argila, pintavam com tinta guache e sempre estavam em ação, o que incomodava quem precisava auxiliar, como a equipe da limpeza e as outras docentes. Isso me levou a questionar: o que eu precisava aperfeiçoar na minha prática profissional docente? Foi então que decidi cursar a Segunda Licenciatura em Pedagogia na Uninter, na modalidade a distância, afinal, já tinha a metodologia, a técnica e a experiência docente como professora de Artes Visuais.

A segunda licenciatura me abriu portas, em diferentes sentidos de compreensão, e passei a resolver melhor os conflitos no trabalho. Comecei a participar do Projeto de Iniciação Científica (PIC), o que me levou a aprimorar a escrita científica e aprofundar leituras teóricas, compartilhando conhecimento nas apresentações orais que precisava fazer. Participei então do ENFOC, XIV encontro de iniciação científica, XIII Fórum científico e V Seminário PIBID, no Campus Garcez, e minha equipe de trabalho conquistou uma menção honrosa.

O ensino EAD exigia a autonomia enquanto estudante. Apresentar o portfólio era o momento em que se tinha brevemente contato com outras colegas do curso, pois na maior parte do tempo a sensação era de solidão nos estudos. Mas é a solidão que impulsiona o crescimento, o foco e a atenção com os estudos, faz a aprendizagem acontecer, e também nos ensina a valorizar os momentos de socialização e trocas de saberes.

Por ter desenvolvido a construção da escrita de artigos acadêmicos, concorri ao Prêmio Científico FAM, que consistia em benefícios para participar do Symposium Internacional Formando Lideranças para o Desenvolvimento Futuro – Compartilhando Experiências. O evento foi realizado em setembro de 2019, no Palais des Nations, sede da Organização das Nações Unidas (ONU) em Genebra, Suíça, e conquistei o segundo lugar da categoria “Humanismo Perene – equacionando direitos e deveres humanos”.

A emoção tomou conta, afinal, nem tudo está no script do planejamento. Quantas pessoas se dedicaram e não colheram o fruto desejado? É necessário sempre fazer mais e dar-se mais, romper os padrões impostos pela família e pela sociedade, bater o pé e defender o que se acredita. Como diria o filósofo Meneghetti: “A mulher não é intencionada por natureza a ser mãe. É, na verdade, coordenada à solidez de autorrealização egoica, à afirmação personológica”.

Mesmo estando ainda no início de minha carreira profissional e acadêmica, aprendi que com empenho e dedicação, com boas relações interpessoais, e até mesmo graças a momentos conflitantes e desafiadores, evoluímos e colhemos crescimento e aprendizado ―nenhum fruto se planta e colhe sozinho.

Assim, a gêmea que seguiu aquele conselho que passou de sua avó para sua mãe, hoje, aos 26 anos de idade, soma mais de 7 anos de atuação como professora da Educação Infantil em Curitiba (PR), sendo formada em duas Licenciaturas, Artes Visuais e Pedagogia. É também especialista em Conservação da Natureza e Educação Infantil, e graduanda do Bacharelado em Ontopsicologia.

Possuo algumas premiações científicas, como o 1° Lugar no relato de experiência do 2° Congresso Internacional “Uma nova pedagogia para a sociedade futura” (2016); a menção honrosa pelo trabalho “Considerações teórico-metodológicas acerca do ensino da arte: a prática com a modelagem na Educação Infantil”, no ENFOC (2018); e o 2° lugar no Prêmio Científico da FAM (2019). Fui ainda semifinalista das edições 2017 e 2020 do Prêmio Arte na Escola Cidadã.

Atualmente, além de estudante e professora, escrevo artigos científicos para livros, revistas e anais de congressos. Também estou aprendendo a escrever narrativas de vida e ensino minhas colegas de classe, mulheres, a escreverem sobre temas que lhes interessam, sobre suas práticas no trabalho, de forma científica. Enfim, sou professora e estudante, pois estudar é viver.

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Autor: Thayse Smek Uberna – Pedagogia (Curitiba-PR)
Revisão Textual: Jeferson Ferro


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