OPINIÃO

Para ser negro tem de ser “feio”?

Ana Caroline Paulino*

Meu processo de embranquecimento começou aos 6 anos. Minha mãe me levou para fazer o primeiro relaxamento no cabelo, para “soltar os cachos”. Pelo menos era o que diziam. Era difícil ser uma criança negra e não me ver em lugar nenhum, não me identificar com nada. Mas eu tinha de me conformar. O padrão era outro e eu tinha de me encaixar nele. Como solução para não ser negra, me declarei parda. Tudo ok, né? Fico no meio termo e vida que segue.

O procedimento de alisamento do cabelo ocorreu durante dez anos, até que veio o choque de realidade: cabelo quebrado, uma parte maior que a outra. E agora? Comecei a transição capilar, e a partir disso minha vida mudou. O modo de me ver e me identificar também mudou.

A aceitação não é de um dia para o outro. Não é fácil, requer muita força, resistência, paciência e pesquisa. Aprendemos que não somos bonitas, nosso cabelo é “ruim” e, dependendo do tom de pele, somos escuras demais. Nós, mulheres negras, sofremos duplamente: por sermos mulheres e por sermos negras.

Há alguns comentários que fizeram parte dessa minha trajetória. Expressões como “Você não é negra, porque você é bonita”, “Mas seu cabelo é bonito, definido, formam cachinhos”, “Olha esse nariz de batata”.

Mas, ok ter o cabelo no tipo 3C, ele forma cachos. Então quer dizer que a mana do 4B/4C (crespo) não está ok? Para ser negro tem de ser “feio”? O que é ser feio? É estar fora dos padrões? De qual padrão estamos falando? Qual o problema do meu nariz não ser fino, não ser padrão europeu? São perguntas que sempre me faço, para as quais nunca encontro uma resposta. E quando questiono as pessoas a respeito, elas dizem que é apenas uma opinião – racista, mas uma mera opinião.

Foram mais de 350 anos de escravidão, são 129 anos da falsa abolição, e durante todo esse tempo estamos na luta pela aceitação, pelo empoderamento, e para conquistarmos nosso espaço. Com muito prazer eu informo que sim, vocês terão de nos aceitar. Nós estaremos sempre por aí, nas universidades, nos bairros nobres, nas comunidades, no escritório, nas ruas, na televisão, escurecendo as coisas.

Ensinem as suas crianças: ser negro é lindo, é símbolo de muita resistência, motivo de muito orgulho. Ah, e seu crespo também é lindo, coloque-o para cima, o céu é o limite. Aceitação concluída com sucesso, eu sou NEGRA. Sem essa de parda, mulata ou moreninha.

Representatividade importa!

* Ana Caroline Paulino é estudante de Jornalismo.

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