Duas histórias ligadas pelo amor às Letras

Autor: Adriane Vasconcelos de Souza - assistente de comunicação acadêmica

“Cresci junto com os livros que li. Sempre enxerguei neles uma forma de me sentir menos só, de encontrar meu lugar no mundo!”, é assim que a estudante de Bacharelado em Letras da Uninter Honorina da Rocha Cavalcante, de 25 anos, define sua paixão pela literatura. Com uma fala potente, de quem sabe o que quer, a acadêmica tem uma história cativante, marcada pela coragem e desafios.

Natural de Juazeiro, na Bahia, ela sempre teve os estudos como prioridade em sua vida. E os livros sempre lhe fizeram a companhia que faltou durante sua passagem pela escola. “Sempre fui apaixonada por literatura e, por ser uma pessoa com deficiência, meu círculo social sempre foi muito reduzido. E eu via nos livros uma chance de não me sentir tão sozinha”, comenta. Daí veio a vontade de cursar Letras, escolha que fez ainda no ensino médio.

Devido à sua condição clínica de paralisia cerebral, ela precisa utilizar a cadeira de rodas, mas isso nunca foi uma barreira. Seu apreço pelos livros era tanto que não demorou muito para que também passasse a tomar gosto pela escrita. Começou a fazer seus primeiros escritos ainda na infância, aos 13 anos, um prazer que cultiva até hoje.

A jovem conta que durante os últimos anos do ensino médio já projetava ingressar no curso de Letras, mas que sua região não oferecia o que ela buscava.

“Eu fiz o Enem, consegui tirar 800 pontos na redação e sabia que isso dava metade de uma bolsa na faculdade, mas na minha região só tem licenciatura e eu nunca me vi dando aula, eu queria mesmo é ter contato direto com a escrita”, conta.

Depois de longas pesquisas na internet, a estudante encontrou na Uninter  o seu tão sonhado curso de bacharelado na modalidade EaD, ao qual tem se dedicado desde o ingresso, construindo dentro da instituição uma jornada acadêmica de destaque, baseada em responsabilidade e dedicação nas atividades e projetos que desenvolve.

Histórias que se cruzam

Outro aluno que vem se destacando no mesmo curso é Gabriel Rocha Lemos de Almeida, de 24 anos.

Natural de Fortaleza, no Ceará, Gabriel também é um jovem apaixonado por livros e pela leitura desde muito cedo. Na escola, sempre foi dedicado e focado aos estudos, o que lhe rendeu um bom aproveitamento no ensino básico.

“Sempre fui um garoto muito apaixonado por livros, desde pequeno. Lia as histórias infantis da escola e, posteriormente, fui tendo contato com os famosos best-sellers, conforme entrava na adolescência. Essa minha paixão por leitura sempre foi consonante com a minha dedicação e gosto por Língua Portuguesa”,  comenta o estudante.

E na conclusão do ensino médio, tendo ele o Direito e as Letras como opções de carreira, a segunda acabou sendo a escolhida. Não por acaso, já que sempre esteve mergulhado nesse universo.

Finalizou o ensino médio em 2018 e por ter feito a aprova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), acabou passando para o curso de licenciatura em Letras em uma universidade de sua região. Ele até chegou a cursar três semestres, mas não se encontrou na modalidade.

“Eu tenho adquirido ótimos ensinamentos sobre o campo educacional. Notei que a licenciatura não estava suprindo o meu desejo de estudar a literatura com mais profundidade, não apenas como componente educacional, mas em uma perspectiva teórica e histórica. Depois de muito refletir, decidi trancar meu então curso e partir em busca de um bacharelado”, relata.

Gabriel também é PcD devido a algumas sequelas do seu nascimento. A falta de oxigênio no sangue, segundo relatos de sua mãe Antônia, fez com que tivesse que ficar alguns dias internado no hospital. Passados esses dias, recuperado, veio o diagnóstico de paralisia cerebral leve.

“Durante meus primeiros anos de vida tive constantes sessões de fisioterapia, logo pude adquirir uma coordenação motora adequada para ter a minha independência de locomoção motora, bem como de fala, graças a também sessões com fonoaudiólogo”, diz.

Aos quatro anos de idade, Gabriel iniciou nos estudos em uma escola a um quarteirão da casa onde morava – local do qual se recorda com muita alegria, pois ali conheceu seus primeiros professores e fez seus primeiros amigos.

“Nunca  fizeram nenhuma espécie de distinção entre mim e meus colegas, muito pelo contrário. E eu sempre soube da importância das amizades em nossa formação sociocultural”, ressalta.

O ingresso na Uninter

Para Gabriel, que não era habituado ao EAD, a experiência de estudar na Uninter tem sido proveitosa. “Fui  muito bem recebido na hora da matrícula e logo ingressei. Não conhecia muita coisa, mas graças à infraestrutura do AVA Univirtus e à ajuda dos tutores, pude logo me adaptar”, pontua.

Os alunos da Uninter com necessidades educacionais especiais podem contar com o apoio do Serviço de Inclusão e Atendimento aos Alunos com Necessidades Educacionais Especiais (Sianee). O suporte dado pela instituição para alunos com deficiência é um diferencial na visão de Honorina. “Assim eu tenho um atendimento mais especializado e não passo pelo capacitismo, desde que meu polo me inscreveu no programa para que eu pudesse estagiar profissionalmente de maneira remota”,  destaca.

Outro ponto que a aluna destacou são as aulas interativas ao vivo, dando à jornada acadêmica mais dinamismo e interação entre alunos e professores. “Me  deixam muito feliz, pois dão a sensação de proximidade, embora eu acredite que a vida acadêmica por si só é meio solitária”, comenta Honorina.

A iniciação científica

Dentro do curso, os dois acadêmicos agora se destacam na produção de artigos científicos, que já têm previsão de publicação.

Gabriel, que faz parte do time de monitores do Projeto Ciências desde 2023, passou a tomar gosto pela pesquisa acadêmica, o que o motivou a escrever seu primeiro artigo científico.

Seu trabalho tem como base a literatura feminista de Jane Austen, escritora inglesa muito importante no cânone literário e já muito debatida em sala. Ele viu uma oportunidade de fazer dela, uma de suas autoras favoritas, um objeto de estudo.

Foi então que ele conheceu a professora Thays Carvalho Cesar, representante do curso de Letras dentro do Projeto Ciências, cuja orientação acerca das teorias e estrutura do trabalho científico foram cruciais para o seu progresso.

“Ela segurou minha mão, haja vista ser a minha primeira experiência escrevendo um artigo científico. Estar em contato com vários textos teórico-científicos, elaborar uma pesquisa com a professora Thays, aguçou ainda mais minha vontade de aprofundar meus estudos para além da graduação”, relata.

Já Honorina está produzindo seu artigo para discutir o capacitismo em relação à imagem e objetificação do corpo da mulher com deficiência. Desde que começou a estudar na Uninter, ela tinha o desejo de trabalhar a representação PcD na literatura, porque dessa maneira poderia unir duas coisas que sempre deram sentido à sua vida: a literatura e a luta anticapacitista. “Graças à escrita acadêmica agora eu posso dar voz a uma luta que não é só minha, e eu me sinto imensamente grata por isso”, completa.

A professora Thays, ao acompanhar o desenvolvimento dos dois estudantes, ressalta os pontos comuns entre Gabriel e Honorina, “ambos amam a literatura”. Ela recorda que, em um de seus primeiros encontros encontros com Honorina, a estudante afirmou: “a literatura me salvou!”. A frase ficou na memória e marcou a vida da educadora.

“Eles têm um amor muito grande pelo texto literário. A partir desse amor, eles encontraram uma forma de tratar temas importantes e urgentes do nosso tempo”, diz.

Ainda de acordo com Thays, Gabriel mostrou em seu artigo que mesmo sob o domínio do patriarcado, as mulheres encontram maneiras de fazer suas escolhas e seguir com seus ideais.  O aluno utilizou a literatura do romantismo do século dezenove de Jane Austen, fazendo uso da crítica literária feminista de uma forma não anacrônica, para fazer um contraponto com os dias de hoje.

Já Honorina chama atenção para o desapossamento da autoimagem da mulher deficiente, que tem relação profunda com o sexismo da sociedade, que dispõe do corpo da mulher. Se o corpo é um corpo deficiente, ele passa a ser propriedade de todo mundo.

O trabalho traz à tona debates que inclusive partem da vivência de Honorina enquanto cadeirante, como reflete a professora Thays. “As pessoas pegam na cadeira, mas a cadeira passa a fazer parte do corpo de uma pessoa que é cadeirante. E as pessoas tocam sem permissão muitas vezes, sem perguntar se aquilo é uma vontade dela”.

A partir da experiência com os estudantes e com o trabalho na área de direitos humanos, a professora Thays destaca a importância do espaço acadêmico para a garantia de igualdade de direitos. “Eu quero muito que o espaço acadêmico se abra para essa representatividade das pessoas com deficiências, para que elas possam falar por elas mesmas, sem que outras pessoas contem essas histórias, sem que esses narradores oniscientes tracem o destino dessas pessoas”, ressalta.

Projeções para o futuro

O artigo de Gabriel já foi encaminhado para a revista Caderno Intersaberes e tem previsão de publicação para o início do mês de junho.

Já Honorina, que está ainda em processo de construção do seu artigo, a publicação está prevista para o ano que vem, no livro anual da área de Letras – que reúne diversos trabalhos científicos dos alunos.

Sobre sonhos e projetos de vida de cada um, Honorina deseja trabalhar com a literatura, escrevendo e publicando seus livros. Seu propósito é alcançar muitas vidas, mostrando que pessoas com deficiência são capazes de realizar seus sonhos. A aluna pretende seguir carreira de copywriter e já visualiza seguir para a pós na Uninter.

“Apesar do que parece, são duas carreiras muito próximas e que têm a escrita como centro, então simplesmente parece o meu lugar ao sol”, afirma.

E Gabriel também planeja trabalhar com livros, escrita e linguagem. O discente diz que tem vontade de fazer parte de uma editora ou de um jornal e dar sequência aos seus estudos. Sua meta é chegar um dia ao doutorado.

“Paulo Freire diz que no processo de educar a gente aprende, e eu aprendo muito com eles. É um prazer a cada encontro, a cada conversa, ver a dedicação deles. E sabendo dos percalços de cada um, nós vemos que não são alunos que aprecem todos os dias”, comenta emocionada a professora Thays, em relação aos estudantes. “São pessoas dedicadas aos estudos e que sabem do seu potencial e o quanto podem contribuir com a sociedade”, conclui.

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Autor: Adriane Vasconcelos de Souza - assistente de comunicação acadêmica
Edição: Larissa Drabeski
Créditos do Fotógrafo: Arquivo pessoal


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