Câncer de Cabeça e Pescoço: quando falar, comer e respirar vira luta
Autor: *Vaniele Pailczuk
O mês de julho traz uma cor forte e simbólica: o verde, que representa a luta contra o câncer de cabeça e pescoço, lembrado mundialmente no dia 27 de julho. Embora seja uma das neoplasias mais frequentes no Brasil, essa ainda é uma doença cercada por desconhecimento, receio e negligência. Segundo estimativas do Instituto Nacional de Câncer (INCA), o país pode chegar a quase 120 mil novos diagnósticos em 2025, envolvendo regiões como boca, garganta, faringe, laringe, cavidade nasal e glândulas da cabeça.
Por muitos anos, esses tumores foram vistos como consequência exclusiva do tabagismo e do consumo excessivo de álcool, afetando especialmente homens acima dos 50 anos. Porém, essa realidade está mudando: mulheres e jovens adultos têm aparecido cada vez mais nas estatísticas, e isso preocupa.
Especialistas alertam para a relação com o HPV, transmitido principalmente pelo sexo oral sem proteção, somada à baixa cobertura vacinal contra o vírus. O problema se agrava porque a maior parte dos casos é identificada tarde demais. Os primeiros sinais, como feridas persistentes na boca, rouquidão, dor ao engolir e nódulos no pescoço são frequentemente ignorados ou confundidos com infecções comuns. Quando o câncer é finalmente diagnosticado, ele já avançou.
Em muitos desses casos, é preciso recorrer à traqueostomia, uma intervenção que cria uma abertura na traqueia para permitir a respiração. Esse procedimento salva vidas, mas também impõe limites profundos: a perda da voz, a dificuldade para se alimentar e o medo de sair em público. É mais do que um tratamento: é uma ruptura com a autonomia, com a identidade e com a rotina.
Como enfermeira, já vi de perto os efeitos emocionais e sociais desse tipo de câncer. Vi mulheres jovens perderem a voz, homens deixarem de sorrir, famílias inteiras desmoronarem diante do desconhecimento e da culpa. O câncer de cabeça e pescoço não cala só a boca: ele silencia afetos, trabalhos e histórias inteiras. Por isso, o Julho Verde precisa ser levado a sério. Não basta vestir a cor: é preciso transformar o cuidado.
Ações concretas, como a vacinação universal contra o HPV, campanhas que falem diretamente com jovens e adultos, formação de equipes de saúde para identificar precocemente os sintomas, e garantia de tratamento integral no SUS são caminhos reais para mudar esse cenário.
É preciso deixar de lado o constrangimento e falar abertamente sobre um câncer que, sim, pode ser prevenido e tratado, desde que seja visto, ouvido e priorizado. O direito de respirar, falar, se alimentar e viver com dignidade não pode continuar sendo ignorado, porque o silêncio neste caso não é opção. É sentença.
*Vaniele Pailczuk é enfermeira, especialista em UTI/ Urgência e Emergência, professora e tutora de cursos de pós-graduação na área da saúde no Centro Universitário Internacional Uninter.
Autor: *Vaniele PailczukCréditos do Fotógrafo: Banco de imagens Pexels
