Qual o valor de uma pessoa gorda?

Autor: Priscilla Bortolotto Ribeiro

Na primeira quinzena deste ano, veio à tona um debate nas redes sociais sobre o tema: gordofobia, cujo significado é – “repúdio ou aversão preconceituosa a pessoas gordas, que ocorre nas esferas afetiva, social e profissional”, debate que ao meu ver, foi tímido perto do acontecimento que o originou.

Tudo começou após um influencer – que é considerado uma pessoa de sucesso por ter aposentado seus pais aos 18 anos de idade e ter faturado mais de R$ 50 milhões no mercado digital – fez a seguinte declaração, durante uma entrevista em um podcast: “Esses dias me perguntaram no Instagram: ‘você ficaria com uma menina gorda?’ É óbvio que não! Porque eu sou um jovem de 18 anos que passou três anos de frente para uma tela construindo riqueza, me tornando uma pessoa de valor. Então, eu quero uma pessoa do mesmo nível, que se cuida, uma pessoa de valor. GG para mim é que não dá!”.

Ao tomar conhecimento da frase do influencer, a questão que se levanta é: “Pessoa gorda não é uma pessoa de valor?” Não é preciso ser gordo para sentir dor, aversão ou repúdio ao ler a fala descrita acima. Basta ser humano, ter empatia e imaginar o sentimento de desprezo e desvalorização que a pessoa gorda enfrenta, diante de narrativas como esta.

Existe uma marginalização que nem sempre é vista pelos nossos olhos e sequer é levada para discussão. A limitação do corpo gordo é real, seja na catraca do ônibus, nos assentos de aviões, nas roupas de grifes – que vestem até o tamanho 44 – nos brinquedos dos parques de diversões e para o estarrecimento de quem desconhece os problemas enfrentados por uma pessoa gorda: no atendimento médico. Sim, isso mesmo, não são incomuns os relatos de pessoas obesas necessitarem de atendimento médico e o profissional  empregar o conceito simplista de que qualquer queixa é somente por causa do sobrepreso, sem sequer solicitar exames para apurar a real origem da queixa. Dados apontados em uma pesquisa feita no Canadá e apresentados pela acadêmica de Jornalismo, Rebeca Kroll, na revista acadêmica Arco, relatou que no ano de 2019, 18% dos médicos afirmaram se sentir enojados ao atender pacientes gordos e 33,3% indicaram ficar frustrados com pacientes que têm obesidade. Esse modo de pensar resulta em consultas desrespeitosas e vexatórias, negligenciando a saúde da pessoa com sobrepeso.

Além de tudo isso, a saúde mental, como vai? Mal, infelizmente. Sim, pois a pessoa gorda além das barreiras citadas acima, ainda precisa enfrentar diariamente piadas e escutar frases preconceituosas como: “Gordo preguiçoso”, “gordo relaxado”, “gordo sem noção”, “gordo espaçoso” e, por aí vai, a lista é grande. Inclusive, esse preconceito reflete até no mercado de trabalho. Uma pesquisa realizada pelo grupo Catho constatou que 65% dos presidentes e diretores de grandes empresas têm restrições ao contratar pessoas obesas, ponto este que, sem dúvida, afeta a autoestima e a saúde mental da pessoa gorda. O fato é que a pessoa gorda é tão capaz quanto a magra e o preconceito deve ser interrompido com urgência. Certamente, as empresas que conseguirem voltar os seus olhos para a pluralidade da sociedade e se despirem do preconceito contra a pessoa gorda, tendem a ganhar riqueza de talentos, até porque a empresa que não agrega o diferente em seu corporativo ficará para trás.

Por fim, como operadora de direito, cabe informar que não há uma lei específica que puna a prática em si da gordofobia, porém, é passível de uma ação indenizatória na esfera civil com base no Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. Na área trabalhista, o empregador pode vir a responder uma ação de danos morais e, na área criminal, pode haver interpretação de injúria e ser considerado um crime contra a honra.

*Priscilla Bortolotto Ribeiro é Professora/tutora de cursos de pós-graduação da área de Direito na Uninter.

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Autor: Priscilla Bortolotto Ribeiro
Créditos do Fotógrafo: Pexels


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