Cineclubes promovem a cultura nacional e instigam o senso crítico dos estudantes

Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo

Os filmes são muito utilizados por professores em salas de aula para agregar conhecimento e despertar o senso crítico dos estudantes, a partir de reflexões e debates. Desde 2014, a Lei nº 13.006 coloca como obrigatoriedade a exibição de pelo menos duas horas de obras nacionais por mês em escolas de educação de base. Mesmo com a reforma do ensino médio, a legislação se manteve e deixa aberto o diálogo sobre o melhor modelo para aplicação.

No entanto, de acordo com o professor Douglas Lopes, que atua na área de Humanidades da Escola Superior de Educação (ESE) da Uninter, a lei é pouco cumprida e, quando acontece, não há uma metodologia didático-pedagógica planejada e eficiente, pensada para complementar a formação dos estudantes. Uma solução apontada pelo docente são os cineclubes.

“É um instrumento que pode ser utilizado em empresas, sindicatos, associações, ongs, qualquer lugar que haja um núcleo de formação. Na história do Brasil, o cineclubismo conseguiu se interiorizar justamente a partir dessas instituições. A maioria das cidades não tinha salas de cinema, como hoje há uma escassez no interior, mas tinha o cineclube, que ajudava a comunidade a ter acesso à cultura, e não somente isso, mas para pensar sobre. Tem uma experiência formativa comunitária muito mais ampla, profunda”, explica.

Segundo o professor Nilson Morais, também da área de Humanidades, a ideia da legislação é “democratizar o acesso à produção audiovisual nacional”, com a discussão de modelos para utilização e então o debate sobre as obras projetadas. A ideia central é promover autonomia para a comunidade escolar, com a garantia de acesso aos clássicos nacionais para aos estudantes. “A proposta é essa, para aqueles que não entenderam, se apropriarem do debate e constituir um novo conhecimento”, afirma.

A importância de a legislação estar centrada especificamente em obras nacionais parte da problematização de questões que são próprias dos brasileiros, como a desigualdade social, o racismo, levando em consideração a cultura brasileira. Além disso, há a possibilidade de alfabetização do audiovisual. “A câmera consegue dizer várias coisas de forma que às vezes a escrita não consegue”, complementa Douglas.

O profissional lembra que a programação para anos iniciais do ensino fundamental e os anos finais do ensino médio não é a mesma, já que são faixas etárias bastante distintas, mas há sim títulos apropriados para todos os públicos no mercado cinematográfico e dentre os vários movimentos fílmicos brasileiros. Pensando nisso, Nilson faz uma indicação que vale para os dois níveis de educação.

O ano em que meus pais saíram de férias é um longa de 2006, com direção de Cao Hamburger, que se passa no ano de 1970 e narra a ditadura militar brasileira sob a perspectiva de um garoto de 12 anos, depois que os pais, militantes de esquerda, precisam fugir.

“O que mais me marcou nessa abordagem é a percepção de uma infância na década de 1960 que é diferente em 2018, 2019, quando trabalhei o filme em escola. Perceba a importância da obra, é um filme de cinema nacional, ideológico, que faz uma crítica contundente na perspectiva de uma criança à ditadura militar, mas que consegue trazer os elementos da pureza, da relação dessa criança com o primeiro amor, o futebol, os ídolos”, salienta Nilson.

Estigmas sobre o cinema nacional

Há muitas discussões sobre os filmes brasileiros serem “bons ou ruins” e a apresentação de conteúdos relacionados a violência, nudez, drogas e palavrões. Douglas ressalta que isso tudo tem muito a ver com o contexto histórico de produção. Em 1969, a Empresa Brasileira de Filmes (Embrafilme) foi criada pelo Estado brasileiro, que traz, além do avanço no financiamento, também a censura. Sem a possibilidade de roteiros políticos e críticas ideológicas, por exemplo, a saída são as pornochanchadas.

“É importante se levar em consideração que temos um gênero cinematográfico que deixou suas características, registros, mas foi criado nesse contexto. Claro, se pensar nas escolas, é não indicado, mas para a gente pensar a produção cinematográfica, existe muito conteúdo”, diz o professor.

Sem políticas públicas de incentivo, a produtora e distribuidora Embrafilme perdura até 1990 e é extinta pelo então presidente Fernando Collor de Mello. Só no início dos anos 2000, com a equiparação do real e o dólar, é que surge a Agência Nacional do Cinema (Ancine), para fomentar a indústria cinematográfica do Brasil.

Para se pensar nessa realidade da indústria, Douglas indica o filme As histórias que o nosso cinema não contava, de 2017, dirigido por Fernanda Pessoa e disponível em plataformas de streaming. O longa apresenta elementos da cultura nacional de forma crítica e provoca reflexões, a partir de “uma releitura histórica sobre o período da ditadura militar no Brasil retratada por meio de imagens e sons exclusivos da pornochanchada”.

“Não temos um mercado potente como Hollywood, por exemplo. Não existe tantas empresas que se desdobram a investir em produções e precisa de políticas públicas para o desenvolvimento de sétima arte”, conclui o docente.

Para conhecer mais sobre a história dos cineclubes e a importância deles para o acesso à cultura brasileira, assista a edição completa do Cinelongando sobre Como fazer um cineclube na escola?, apresentada pelos professores Douglas Lopes e Nilson Morais, no dia 23.jun.2021. A transmissão segue disponível para livre acesso neste link.

Incorporar HTML não disponível.
Autor: Nayara Rosolen - Estagiária de Jornalismo
Edição: Mauri König
Créditos do Fotógrafo: Pavel Danilyuk/Pexels e reprodução


Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *